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Opinião

Eu não sou medricas, tu é que és

Montenegro e Santos parecem querer servir, antes de tudo mais, as próprias claques. Estou céptico

Há duas formas de imaginar a cena final entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos. Sei que a mais óbvia seria o bom velho duelo de faroeste. Aparecer cada um do seu lado da rua larga poeirenta, mão a deslizar para o coldre, a ver quem saca primeiro a arma sob um pôr-do-sol de tensão e enigma. Mas não. Aconteceu de ímpeto mais lusitano, precipitado por provocação e resposta, como dois maduros em festa de aldeia que pegam nos carros e vamos lá a ver qual de nós se desvia antes de chocarmos de frente. No jogo do “eu não sou medricas, tu é que és”, lá chocaram de frente e agora vamos todos andar uns tempos a sacudir os estilhaços. Julguei, optimista, que ambos estavam apostados em simples bluff de póquer. Que em cima da meta, e perante a inconveniência das consequências, um, ou ambos, recuariam de dedo apontado ao outro, fica o aviso. Mas não. Aí vamos nós outra vez, no menos indicado, mais evitável, supérfluo período. Faço por entender um e outro. Até ao ponto em que Pedro Nuno Santos pede Comissão Parlamentar de Inquérito. Uma ideia simples e eficaz: deixar Montenegro continuar a governar, mas com o bafo quente e inultrapassável de uma suspeita escrutinada e vigiada. Uma forma de manter a empresa polémica nas notícias diárias. Já entendo menos que Luís Montenegro tivesse respondido com o pescoço pousado na guilhotina de uma moção de confiança. Recuei quase dez anos, quando David Cameron precipitou o ‘Brexit’ com uma posição de ofendido. Abriu a porta a um referendo que na realidade não queria. E foi atropelado pelo resultado. E agora aqui estamos, e lá vamos nós, apenas um ano depois de nos terem dito que entrávamos em quatro anos de democrática legislatura, que o país estava cansado de ser chamado a votos. E se aqui estamos, no limite será por uma convicção que ambos têm ou se acham capazes de alimentar, por razões que a maioria de nós desconhecerá: Montenegro aposta que vai ganhar com mais músculo, Santos aposta simplesmente que vai ganhar, nem que seja por um voto, e que isso bastará para explicar que o país afinal nunca deixou de ser PS.