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Opinião

A nova geração de médicos tem alguma ideia de “serviço”?

Um grande médico não se forma com uma mentalidade das 9 às 5, as horas extraordinárias são necessárias – para o médico, para os doentes e para os futuros médicos que têm de aprender com os mais antigos. Esta falta de compromisso profissional é algo inerente à nova geração (os últimos millennial e os primeiros gen z) em todos os sectores, mas, claro, nota-se mais nos hospitais

Quando escolhe ser médico, um indivíduo tem de perceber que não está a escolher uma profissão como outra qualquer. Aliás, quando escolhe a medicina, uma pessoa tem de perceber que abdica de parte da sua privacidade e individualidade, porque ser médico não é o mesmo que ser escritor, ferreiro, camionista. É a profissão que está na fronteira da vida e da morte, e, como tal, tem uma responsabilidade pública única. Mesmo que trabalhem no privado, são sempre funcionários públicos no sentido lato.

Ser médico não pode ser apenas uma questão de ego, inteligência, estatuto social ou dinheiro. Ser médico é em si mesmo um compromisso com a comunidade, é em si mesmo um serviço. Ninguém pode dizer o contrário quando começa a estudar medicina. É por isso que me custa ouvir a tal recusa às horas extraordinárias dos médicos mais novos – porque é uma mentalidade que recusa em si mesmo o papel único do médico. Há uma responsabilidade única, uma responsabilidade comunitária que vai além da dimensão privada. O médico tem o papel público nas sociedades modernas que antigamente pertencia ao padre.

Lembrei-me disto durante a leitura desta bela reportagem de Joana Ascensão sobre médicos reformados que voltam ao serviço no SNS depois da reforma. São mais de 700 e contam uma história centrada na ideia da medicina enquanto serviço e que, como tal, acarreta um número de horas extraordinárias acima da média. Faz parte de ser médico. Fica implícito a crítica à nova geração.