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Opinião

Quando estás viva

No início, o tom é formal, depois passa-se ao “tu” e ao nome próprio. Eles já não são Franz Kafka e Milena Pollak, mas K. e M., como se o alfabeto fosse uma heráldica

Kafka esteve noivo três vezes, mas nunca se casou. A sua atraente intensidade era também um autoboicote. Das mulheres da sua vida, a mais célebre é Milena Pollak, que ele conheceu em Praga, em 1920, tenha trinta e sete anos e ela vinte três, e com quem se correspondeu de Março de 20 a Dezembro de 23, já quase no fim. Os encontros íntimos foram escassos, seis dias ao todo, em Viena e em Gmünd, mas as cartas numerosas. Temos as dele, que Milena guardou e a que deu destino, juntamente com diários e manuscritos, mas não as dela. O que faz desta correspondência um diálogo com uma única voz, com outra implícita, uma presença na ausência, uma possibilidade de uma impossibilidade.