O primeiro e, provavelmente, único debate individual entre Donald Trump e Kamala Harris está agendado para terça-feira, 10 de setembro, em Filadélfia: 90 minutos em que os dois candidatos presidenciais se defrontarão perante dois moderadores da ABC, sem público em estúdio. No passado, a sabedoria política convencional indicava que os debates presidenciais não eram assim tão importantes, mas, em 2024, com uma campanha excecional e encurtada, todos concordam que este debate, em particular, será absolutamente crítico tanto para Trump como para Harris.
Que podemos esperar?
Cerca de 90% do eleitorado dos Estados Unidos está dividido em dois grupos altamente polarizados, democratas e republicanos, que estão muito distantes na maioria das questões e estão convencidos de que o seu candidato é a única escolha aceitável. Por muito bem ou mal que Trump ou Harris se saiam no seu debate, não mudarão a preferência de nenhum destes eleitores. Numa curiosa reviravolta do impacto do sistema do Colégio Eleitoral e da distribuição geográfica do eleitorado americano, porém, os eleitores já decididos dificilmente importam. É um número minúsculo de eleitores hoje indecisos em alguns estados indecisos que decidirá quem ganhará em novembro.
As últimas sondagens nestes estados mostram os dois candidatos empatados. Uma mudança de opinião de apenas 1% ou 2% neste grupo, que pode ser resultado de uma atuação vencedora ou perdedora no debate, pode muito bem traduzir-se na margem de vitória.
O ex-Presidente Trump participou em mais debates presidenciais individuais do que qualquer outra pessoa na História: este será o sétimo. A vice-presidente Harris só participou num debate deste tipo, contra o vice-presidente Mike Pence, em 2020, pelo que, em termos de experiência, Trump tem clara vantagem sobre Harris. Mas os resultados foram menos favorável a Trump, visto como tendo perdido a maior parte desses debates. A sua única vitória clara foi no debate de fim de junho deste ano contra o Presidente Biden, que teve um desempenho tão miserável que levou à sua retirada da corrida. Considera-se que Harris superou Pence no seu debate.
Dos seus anos como procuradora distrital de São Francisco e procuradora-geral da Califórnia, Harris tem vasta experiência como procuradora em tribunal, onde é essencial a capacidade de ser rápida e de contrariar tácticas agressivas. Neste debate, Harris tem mais a ganhar e a perder do que Trump. Penso que precisa de ganhar o debate para prosseguir o seu caminho para a vitória em novembro.
O público não vai aprender nada de novo sobre Trump, pois tem sido bombardeado pela sua presença constante nos media há quase dez anos, mas muitos não conhecem bem Harris. Esta é uma ocasião para criar uma impressão mais clara da vice-presidente menos familiar. Ela vai querer parecer, sem dúvida, fria e presidencial, e também tentar levar Trump a perder o seu autocontrolo, o que tem feito frequentes vezes em debates anteriores.
Curiosamente, sabemos de antemão os temas que os dois candidatos vão apresentar. É como uma peça de teatro de Shakespeare em que toda a gente já conhece a história e podemos praticamente adivinhar como cada candidato vai apresentar os seus argumentos.
Trump vai atacar Harris tentando, tanto quanto possível, ligá-la ao impopular Presidente Biden; culpando-a pelo aumento do custo de vida e pelo elevado número de imigrantes ilegais que entraram nos Estados Unidos durante a Administração Biden/Harris; procurando mostrar que é uma radical de esquerda, sem convicções claras, uma vez que mudou de posição numa série de questões importantes.
Os ataques de Trump serão julgados, por um lado, em função da sua eficácia e da capacidade de Harris para contrariá-lose, por outro lado, em função do tom de voz. Se Trump a atacar de forma demasiado agressiva, os eleitores indecisos poderão não gostar das suas táticas de intimidação.
Harris atacará Trump sobre o aborto, em que a maioria dos eleitores é a favor da abordagem do Partido Democrata; sobre os seus planos de baixar os impostos para os ricos, em contraste com o seu enfoque na classe média; sobre a proposta de impor direitos aduaneiros, vista por praticamente todos os economistas como perigosamente inflacionista; e sobre a sua abordagem geral de querer que os americanos regressem a um passado idealista. A candidata irá sugerir que a América está cansada deste cenário, que precisa de virar a página sob a sua liderança orientada para o futuro, conduzindo o país para um futuro melhor.
Mesmo que saibamos qual será o conteúdo deste debate, não sabemos quem vai ganhar, quem dos dois dará um murro na mesa particularmente astuto que atingirá em cheio o adversário, ou quem fará uma declaração que será repetida milhões de vezes nas redes sociais, desacreditando quem a disse ou quem a recebeu. O conteúdo não é importante, o que conta é o tom e a capacidade de dizer frases memoráveis que os americanos vão agarrar. Deverão ser 90 minutos excecionalmente interessantes, um exemplo perfeito de “política como entretenimento”, mas com consequências bastante graves.
Patrick Siegler-Lathrop é um empresário franco-americano a viver em Portugal há 15 anos, autor de “Rendez-Vous with America, an Explanation of the US Political System” e atual presidente do American Club of Lisbon. As opiniões expressas neste artigo são da exclusiva responsabilidade do autor, não sendo de forma alguma atribuíveis ao American Club of Lisbon. Pode ser contactado através de PSL64@icloud.com.