A 10 de Janeiro, a SEC, o regulador norte-americano equivalente à CMVM, aprovou o lançamento de 11 ETFs focados exclusivamente em bitcoin para negociação em bolsas nos EUA. Um anúncio muito antecipado, já que a primeira tentativa de se lançar um destes fundo de investimento foi há uma década – mas as várias candidaturas foram sendo rejeitadas. O que mudou? Qual o impacto destes ETFs? E qual a relação entre o que se passa no outro lado do Atlântico e as nossas legislativas?
Em primeiro lugar, importa perceber que, a nível regulatório, o resto da OCDE já tem enquadramentos legais maduros para a cripto-economia. Os EUA têm ficado para trás devido a um contexto político polarizado, deixando as agências de supervisão sem eira nem beira, livres para competir sem motivo. O caso do ETF foi uma pedra no charco, já que em Outubro um tribunal obrigou liminarmente a SEC a rever a rejeição de uma destas 11 candidaturas, abrindo a porta para a decisão histórica.
A expectativa desta mudança também já tinha melhorado quando a BlackRock, o maior gestor de activos do mundo, decidiu entrar nesta corrida. Até hoje o gigante da finança tradicional tinha tentado a aprovação de 576 ETFs diferentes, tendo apenas falhado um. E, apesar do interesse de Wall Sreet pela cripto economia já ter começado em 2015, tendo registado um pico em 2021, só recentemente é que se começou a passar dos projectos-piloto para a criação de produtos dedicado ao retalho.
E é aqui que se percebe o impacto dos ETFs de bitcoin. Embora inicialmente a indústria de criptoactivos os tenha olhado de lado, pois não deixam de ser contrários aos objectivos iniciais deste ecossistema onde se promove o controlo pessoal das finanças, sem intermediários, recentemente a atitude mudou. Por um lado, correndo mal serão a publicidade perfeita para a importância da alteração do paradigma financeiro tradicional. Por outro, correndo bem, também trazem publicidade e não entram em conflito com o sistema alternativo criado entretanto, já que os ETFs também democratizaram o acesso das massas a produtos mais complexos, tipicamente reservados aos ricos. E quem está interessado em comprar um destes fundos tipicamente não está interessado em aprender a utilizar a tecnologia subjacente nem em “ser o seu próprio banco”.
Por último, onde é que entram as legislativas de Março? Ora, na Europa já tínhamos acesso a produtos equivalentes a estes há muito, mas que não são populares pois, entre outras razões, por cá podemos facilmente adquirir e interagir com criptoactivos de forma regulada e segura. Foi este ambiente que permitiu ao velho continente acolher os hubs mais vibrantes desta nova economia digital a nível global, quer pelo lado dos utilizadores, quer pelo lado de quem a desenvolve. Portugal está inclusive no “topo do mundo da cripto economia”, como o Expresso noticiou em Maio. Será que os partidos políticos vão continuar a ignorar o tema ou haverá quem perceba a oportunidade de crescimento e lhe dedique espaço nos programas?
Hugo Volz Oliveira é secretário do Instituto New Economy, que agrega líderes de indústria e cidadãos que queiram promover a participação Portuguesa na economia digital; organizando eventos educativos, publicando artigos de investigação, e criando comissões de melhores práticas e de ética sobre tecnologias emergentes.
Nota: O autor escreve ao abrigo do Antigo Acordo Ortográfico.