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Chega, BE e Pedro Nuno Santos: de repente, todos querem parecer moderados

A moderação procura dialogar com o objetivo de chegar a posições equilibradas. Esta forma de abordar a vida e a política pressupõe capacidade para perceber opiniões contrárias e, ainda, que os consensos são a melhor forma de garantir a estabilidade política e manter a coesão social. Contudo, para serem cívicos, estes compromissos devem ser convictos e não meramente oportunistas

A dicotomia direita/esquerda é redutora e explica cada vez menos sobre os partidos e seus protagonistas. No atual contexto da política portuguesa, e em ambiente pré eleitoral, os cidadãos não podem deixar de equacionar outras duas dicotomias fundamentais: moderação/radicalismo e prática cívica/prática populista. Estas não são a mesma coisa. Por exemplo, o ultraliberalismo da IL é radical mas não populista, pois é convicto, diz claramente ao que vem, sem demagogias ou manipulações. Por igual, a convicção do PCP que tudo se resume à luta de classes, e o seu repúdio a tudo o que seja iniciativa privada, também é radical, mas não populista.

Tanto o ultraliberalismo quanto o comunismo, extremos opostos em que não me revejo, são inequivocamente convictos e previsíveis. Ou seja, o ultraliberalismo da IL e o comunismo do PCP são opções radicais mas não populistas. Contudo, se o PCP é claramente um partido de esquerda, é difícil classificar a IL como um partido de direita. Aliás, os próprios não se assumem como tal. No que respeita a questões de costumes, outrora apelidadas de “fraturantes”, a IL está próxima do BE. Por sua vez, o PCP tem uma posição conservadora em várias matérias, como, por exemplo, a chamada “ideologia de género”. Por aqui se comprova como a dicotomia direita/esquerda é generalista e redutora.

Por sua vez, a oposição entre prática cívica e prática populista tem pontos comuns, claro, com a oposição entre moderação e radicalismo, mas com nuances. Como já referi por várias vezes neste espaço, o populismo é uma prática e não uma ideologia. Há populistas ultraliberais, como o inqualificável Javier Milei, novo presidente da Argentina, e populistas anti capitalistas e “imperialistas”, como Nicolas Maduro, presidente da Venezuela. Em Portugal, o populismo tem o Chega por expoente. Os ingredientes estão lá todos: um partido de um só protagonista; as generalizações abusivas – “todos os políticos são corruptos” e “todos os imigrantes são bandidos”; o maniqueísmo – “as pessoas de bem contra os corruptos e o sistema”; e a palavra de ordem - “vergonha!”.

Corrupção e imigração são temas de eleição de qualquer populista que se preze. Estes continuarão a ser bandeiras exclusivas do populismo enquanto os que estão na política de forma cívica tiverem receio em abordá-los. Nem todos os políticos são corruptos (quero acreditar que apenas uma minoria o é), mas é perceção comum que existe corrupção e tráfico de influências. Também, a emigração é desejável mas, como tudo, tem de ter regras. Este é um tema em que os moderados evitam falar, e em que os radicais falam com demagogia.

Tal como os cidadãos portugueses devem ter um contrato tácito com o Estado e um compromisso com a comunidade, também os emigrantes devem ter um compromisso com o Estado que os recebe, um compromisso que implique a aceitação de valores humanistas e democráticos, de regras cívicas, e a intenção de procurar a familiarização com a nossa cultura. Isto nada tem de “xenófobo”, e pode ser dito de forma sensata, não incendiária ou demagógica. Luís Montenegro, que tenho criticado, teve o mérito de abordar o tema de forma serena e realista no último congresso do PSD.

A moderação procura dialogar com o objetivo de chegar a posições equilibradas. Esta forma de abordar a vida e a política pressupõe capacidade para perceber opiniões contrárias e, ainda, que os consensos são a melhor forma de garantir a estabilidade política e manter a coesão social. Contudo, para serem cívicos, estes compromissos devem ser convictos e não meramente oportunistas, como foi o caso do exercício de equilibrismo de Pedro Sánchez. Este obteve um acordo contra natura de investidura (não de legislatura, note-se) que é tudo o que um compromisso político não deve ser: incendiário, precário e amoral.

Para serem bem sucedidos em política, a moderação e o civismo têm de ser corajosos e convictos. Sem temas a evitar, nem receio de explicar propostas. Regra geral, as posturas cívicas e moderadas têm mais dificuldade em passar a mensagem que as radicais e populistas. Por isso, é surpreendente que, de repente, todos queiram parecer moderados. André Ventura, sempre plástico, tem dias em que parece um menino de coro; Pedro Nuno Santos afirma-se um social democrata de sempre (se bem que, é certo, a social democracia é uma ideologia de esquerda) e acusa o PSD de radicalismo; até Mariana Mortágua adoptou um tom sereno, e os cartazes do BE perguntam, com espanto, se as medidas que propõem são radicais. De repente, todos descobriram as virtudes da moderação, apesar de alguns serem convictamente extremistas. Cabe agora aos eleitores distinguir o trigo do joio.