Opinião

Há muito mais no Residente Não Habitual do que pensionistas

O economista João Moreira Rato, um dos subscritores do manifesto “Não matem o investimento no futuro de Portugal”, defende a importância do RNH para a captação de talento para Portugal

A população portuguesa nunca foi tão qualificada como hoje, mas a produtividade da economia não se aproxima da europeia. Como os salários estão associados aos níveis de produção de cada trabalhador, estes também não têm convergido para níveis europeus. Este paradoxo explica-se com o anémico nível de investimento em capital físico: cada português detém menos e piores equipamentos para trabalhar em comparação com os seus pares europeus.

É esta dinâmica negativa que conduz ao flagelo da emigração de talento nacional. Acresce que a baixa taxa de poupança em Portugal não é suficiente para inverter este círculo vicioso de reduzido investimento e baixa produtividade.

Fica claro que Portugal está muito dependente do investimento estrangeiro para aumentar a produtividade e, consequentemente, os salários.

Por outro lado, a nossa economia é muito fechada quando comparada com outras pequenas economias europeias. Enquanto Portugal exporta 50% do PIB, a Bélgica, a Holanda e a Eslováquia exportam, respetivamente, 95%, 92% e 99% do PIB. Como o setor exportador tende a pagar melhores salários, conclui-se facilmente que a economia teria muito a ganhar em aumentar o seu grau de abertura.

No entanto, parecemos caminhar para a “albanização” da nossa economia, um destino do qual é urgente fugir para não ficarmos presos num ciclo de empobrecimento. É, pois, crucial atrair capital e talento do exterior, incluindo criar condições que nos permitam resgatar a geração portuguesa mais qualificada de sempre.

Foi por estas razões que fiquei perplexo com a extinção de um instrumento como o Residente Não Habitual (RNH), criado em 2009 e mantido, pela sua utilidade, por sucessivos governos.

O RNH pode e deve ser calibrado de acordo com novos objetivos políticos. Uma afinação possível do RNH consistirá em deixar de incluir pensionistas que não exercem qualquer atividade permanecendo fechados em enclaves de luxo. Mas mantenha-se a sua capacidade de atrair quem traz investimento e quem vem aportar o seu talento à gestão das empresas portuguesas, de forma suprir as deficiências da nossa economia que estão associadas a baixos salários e à emigração qualificada. Podemos não querer ser a Florida da Europa, mas não gostaríamos de ser a Califórnia?

Todos os nossos competidores por talento e investimento no Sul da Europa oferecem regimes similares ao do Residente Não Habitual. Recordo que em Londres, o estatuto de não domiciliado ajudou a transformar a cidade num grande centro europeu de serviços.

Fará sentido extinguir o RNH em vez de o ajustar às necessidades do país?

Em vez de procurarmos explicações simplistas e populistas para os nossos problemas, deveríamos focar-nos em abrir a nossa economia aproveitando todos os instrumentos disponíveis e utilizando todas as alavancas, para torná-la mais produtiva em benefício de todos.