Quando Osama bin Laden escreveu o discurso de quatro mil palavras intitulado “Carta à América”, contava que o poder das suas ameaças reverberasse por todo o mundo, mas não podia adivinhar que a Geração Z e uma plataforma chamada TikTok iriam um dia reavivá-las. Escrita há duas décadas (em 2002) pelo autor intelectual dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, que mataram quase três mil pessoas nos Estados Unidos, a carta expunha os motivos pelos quais o Governo norte-americano teria de ser severamente punido.
Vídeos que fazem referência ao discurso surgiram e multiplicaram-se na rede social TikTok desde início da semana, levando a plataforma a “proativa e agressivamente” removê-los, conta o jornal “The Guardian”. Também a publicação britânica foi confrontada com esse problema: tendo publicado a missiva de Bin Laden na íntegra, em 2002, resolveu eliminar o conteúdo, substituindo-o por um artigo que oferece maior contexto.
A carta e a sua tradução já tinham começado a circular online pouco tempo depois dos ataques, em especial entre organizações islâmicas extremistas, mas o conteúdo foi divulgado pela primeira vez pelo “Guardian”. Na quarta-feira, o diário removeu a transcrição completa, substituindo-a por uma breve declaração: o conteúdo tinha sido “amplamente partilhado nas redes sociais sem o contexto completo”.
“Portanto, decidimos retirá-lo e redirecionar os leitores para a notícia que originalmente o contextualizava”, pode ler-se no comunicado. De acordo com o site “Politico”, o efeito poderá ter sido justamente o contrário ao desejado. Ao remover a carta online, para tentar limitar a sua distribuição, o jornal pode ter despertado ainda mais o interesse das pessoas, contribuindo para torná-la “viral”. Chama-se “efeito Streisand” a essa relação de causa-consequência, em que a ocultação ou remoção de um conteúdo apenas o torna mais procurado. A “CNN” refere que os vídeos sobre este assunto ascenderam a 14 milhões de visualizações até esta quinta-feira.
Mas por que é que a carta foi “ressuscitada” agora?
Na mensagem dirigida aos EUA e aos norte-americanos, Bin Laden critica duramente a Casa Branca e o seu apoio à criação de Israel, que define como “um dos maiores crimes” do país. Os vídeos que agora foram difundidos dissecam e respondem às palavras da “carta”, associando-as à guerra entre Israel e o Hamas que está em curso. A “hashtag” #lettertoamerica tornou-se tendência, antes de ser bloqueada na rede social. Algumas pessoas refletiam sobre como “a leitura do discurso lhes abriu os olhos”, não permitindo que voltassem a interpretar a geopolítica da mesma forma.
A plataforma TikTok pronunciou-se, em comunicado: “O conteúdo que promove esta carta viola claramente as nossas regras quanto ao apoio a qualquer forma de terrorismo. Estamos a remover esse conteúdo, de forma proativa e agressiva, e a investigar como chegou à nossa plataforma.” A empresa também assegurou que o número de vídeos que divulgavam a carta foi “menor do que o que inicialmente parecia”. A Casa Branca também se posicionou: “Nunca há justificação para espalhar as mentiras repugnantes, malignas e antissemitas que o líder da Al-Qaeda divulgou logo após cometer o pior ataque terrorista da História norte-americana”.