Rashid Khalidi escreveu uma biografia. Nela não fala da vida de uma personagem histórica - mas da vida de uma ideia. A ideia de um país que é o seu - mas não existe como Estado viável fora do coração de milhões de deslocados, refugiados e exilados que continuam a guardar as chaves das suas casas há muito terraplanadas por buldózeres israelitas. Em seu lugar, nas terras internacionalmente reconhecidas como parte desse sonho elusivo a que chamamos Palestina, nasceram colonatos judeus. Khalidi nasceu em Nova Iorque há 75 anos, tem exatamente a idade do Estado de Israel e exatamente a idade do “Nakba”, “a catástrofe”, o primeiro êxodo maciço e forçado do seu povo para abrir espaço ao nascimento do novo país. No seu mais recente livro “Palestina - Cem Anos de Guerra e Resistência” (editado em Portugal pela Ideias de Ler), Khalidi entrelaça a história da sua família, árabe, culta, privilegiada, com a história dos palestinianos que, no ano em que esta história começa, 1917, nem sequer tinham o direito à designação de povo.
O historiador e professor de Estudos Árabes na Universidade Columbia, em Nova Iorque, argumenta numa entrevista ao Expresso que o esforço para fazer desvanecer as características que compõem a identidade palestiniana é apenas uma das muitas vias no caminho para uma realidade que o mundo ocidental conhece bem - a colonização. Mas não são as armas que vão salvar a Palestina. Podem “agitar as coisas, podem até “mudar o paradigma”, “destruir mitos”, mas, em última análise, “Israel é demasiado poderoso para destruir com armas”. Khalidi está de novo a falar de ideias. Desta vez da ideia fundadora que serviu de base ao estabelecimento de Israel naquela terra específica. É uma herança bíblica, é um mito indelével para milhões de pessoas.