Foi tudo no mesmo dia, talvez o mais duro de António Guterres enquanto secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Primeiro, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros fez saber que Guterres não tinha tentado contactar o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, desde o início da “operação militar especial” na Ucrânia. Depois, soube-se que mais de 200 antigos altos funcionários da ONU tinham escrito a Guterres, instando-o a assumir riscos para garantir a paz e acrescentando que a organização enfrenta uma ameaça existencial devido à invasão da Ucrânia por um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança. A missiva, cujos signatários incluíam muitos antigos subsecretários das Nações Unidas, apelava mesmo à deslocação temporária do gabinete de Guterres de Nova Iorque para a Europa para assim estar “mais próximo das negociações necessárias”. E ainda na terça-feira da semana passada, Guterres apelou a uma pausa diplomática no conflito, durante a Páscoa ortodoxa, para a abertura de corredores humanitários, o que não foi respeitado.
Pressionado a agir, o antigo primeiro-ministro português almoçou esta terça-feira com o chefe da diplomacia russa e encontrou-se com Putin em Moscovo. Guterres já está em Kiev para um encontro, esta quinta-feira, com o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Entre uma capital e outra, o Expresso voltou a falar com Arora Akanksha, a ‘millennial’ que no ano passado se quis atravessar no caminho de Guterres quando este reunia apoios para um segundo mandato à frente da ONU. Então com 34 anos e a trabalhar na organização, assumia a ambição de se tornar a mais jovem secretária-geral de sempre e a primeira mulher no cargo, mas não tinha grandes ilusões: tratava-se de uma autonomeação e não de uma candidatura apoiada por um Estado-membro. Então como agora, Akanksha não poupava Guterres e, desta vez, com a agravante de estar em curso uma guerra sem que, segundo críticas de diversos quadrantes, o secretário-geral esteja a intervir eficazmente para a travar.