“Ainda choro face à impunidade dos que tentam silenciar-nos, dos que olham com indiferença para esta tragédia. Mantenho intactos os meus sentimentos e volto, agora, a ter esperança. Esperança de que se saiba a verdade e não se extravie a nossa memória. É tempo fazer justiça”, afirma Carmen López, membro da plataforma Maré Residências, cuja mãe passou quatro dias isolada, em abril de 2020, num quarto do lar Parque dos Frades, em Leganés (arredores de Madrid), a sofrer de pneumonia bilateral.
Carmen decidiu ir ajudá-la. Saiu à rua, violando o confinamento obrigatório e esquecendo os temores dominantes daqueles dias funestos. Venceu a batalha do amor próprio, porque conseguiu que a mãe fosse transferida para o Hospital Severo Ochoa, na capital espanhola, quando a vida lhe escorria pelos dedos. A senhora morreu passado um mês. “O que vivi entre os dias 2 e 5 de abril foi um pesadelo. Telefonava-lhe de manhã e à tarde, mas ninguém atendia. Quando a médica me ligou, por fim, para dizer que ela estava muito mal, não consegui aguentar mais. Apareci lá. Segui a ambulância no meu carro e consegui vê-la ao longe, na maca, pude tocar-lhe através do lençol, sem me aproximar muito”, conta ao Expresso, procurando em vão conter a lágrima que lhe cai pelo rosto.
A sua vontade é quase tão grande como o coração que a impede de sepultar aquela recordação entre os escombros do silêncio. Entre as sombras brota, finalmente, uma luz.