Espanha

Basco, catalão e galego usados pela primeira vez no Congresso dos Deputados espanhol

As línguas co-oficiais estrearam-se em intervenções na câmara baixa das Cortes Gerais de Espanha. Era uma exigência de partidos nacionalistas e independentistas com quem a esquerda negoceia a viabilização do novo Governo do país

Os deputados espanhóis passam a ter à disposição auriculares para ouvirem a tradução simultânea para castelhano das outras línguas autorizadas no plenário
Marcos Villaoslada/Europa Press/Getty Images

Os deputados espanhóis puderam esta terça-feira, pela primeira vez, falar basco, catalão e galego nas suas intervenções no plenário do Congresso, a câmara baixa do Parlamento. Antes havia essa possibilidade, em casos específicos, no Senado.

Esta mudança ao regulamento era pedida por partidos nacionalistas e independentistas com quem a esquerda negoceia a viabilização do novo governo do país. Teve, pois, o apoio do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE, centro-esquerda, chefiado pelo primeiro-ministro Pedro Sánchez) e da frente esquerdista Somar.

A utilização no Parlamento de idiomas que não o castelhano fez-se com o protesto do Partido Popular (PP, centro-direita) e do Vox (extrema-direita). Os 33 deputados desta última formação abandonaram mesmo o plenário após o início da primeira intervenção do dia, a do deputado socialista José Ramon Besteiro, que falou em galego.

PP e Vox consideram que o Congresso dos Deputados é a câmara que representa todo o país e todos os espanhóis, para os quais existe um idioma comum, que permite o entendimento sem necessidade de traduções e auriculares. Protestam também porque a Mesa do Congresso, nas mãos da esquerda, permitiu a utilização do basco, catalão e galego no plenário antes da aprovação das mudanças no regulamento que formalizam essa possibilidade e fixarão a forma como será aplicada.

Congresso parecido com o país ou divisão artificial?

O plenário desta terça debateu e aprovou mudanças no regulamento para permitir a utilização de idiomas além do castelhano, numa proposta apresentada em conjunto pelo PSOE, o Somar e os nacionalistas e independentistas. As mudanças passaram com maioria absoluta de 176 votos a favor, ao abrigo de um procedimento que dispensa pareceres ou apreciações a nível de especialidade e comissões.

A inovação fora anunciada a 17 de agosto, quando começou formalmente a nova legislatura saída das eleições de 23 de julho. O PSOE conseguiu a presidência do Congresso graças aos votos de nacionalistas e separatistas de que Sánchez também precisa para ser reconduzido como primeiro-ministro.

O Congresso comprou no último mês 450 aparelhos auriculares, alugou transmissores de frequência de rádio, instalou ecrãs para passar as intervenções legendadas e recrutou seis tradutores. O socislista Besteiro defendeu que está em causa normalizar o uso de vários idiomas oficiais em Espanha e fazer com que o parlamento “se pareça mais com o país que representa”.

“Os símbolos importam e muito”, disse o deputado, que frisou que os três idiomas são reconhecidos como co-oficiais na Constituição espanhola, que o multilinguismo já é realidade plena nos parlamentos regionais, que o Tribunal Constitucional reconhece a diversidade linguística como “riqueza cultural” de Espanha que deve ser preservada e que está em causa “a superação de uma anomalia histórica”. Os deputados de forças catalãs, galegas e bascas elogiaram “um acordo histórico” que propiciou “um dia histórico”.

Pelo PP, que tem o maior grupo parlamentar, o deputado Borja Sémper — que é basco e usou frases em basco na sua intervenção — defendeu que Espanha “tem a sorte de ser uma comunidade política e uma nação que partilha um idioma comum”. O castelhano, a seu ver, permite o entendimento entre todos os deputados “sem necessidade de fazer coisas esquisitas como colocar um auricular”.

“Não estamos aqui a falar de diversidade linguística”, disse Sémper, que considerou que aquilo que está em causa são “as necessidades aritméticas de Pedro Sánchez”. “É absurdo desvalorizar a língua comum”, insistiu, dizendo que o novo regulamento “impõe a normalidade da divisão” e condenando a “utilização do património linguístico como moeda de troca política”.

Em paralelo, e também a pedido dos independentistas e nacionalistas, o Governo espanhol levou ao Conselho da União Europeia um pedido de reconhecimento do basco, catalão e galego como línguas oficiais nas instituições comunitárias. Os Estados-membros adiaram uma decisão e manifestaram dúvidas em relação ao pedido de Espanha, mas sem vetar essa possibilidade.