Aos 76 anos, Glemie Beasley ainda vende “guaxinins frescos” à porta de casa, um cubículo forrado a placas de zinco, com uma teia de barracões nas traseiras. No congelador da cozinha continuam empilhadas carcaças, sinal de que o negócio floresceu. “Sabe a frango”, garante.
O expediente nasceu da necessidade. Há cerca de uma década, aquando da primeira conversa com o Expresso, este ex-trabalhador da indústria automóvel em Detroit recebia todos os meses 166 dólares (158 euros) da segurança social. Hoje, como naquela altura, senta-se numa cadeira de baloiço sob o alpendre, com uma velhinha guitarra semiacústica, e apregoa: “20 dólares cada, 30 por dois”.
Beasley tornou-se figura popular, símbolo de uma recuperação arrancada a ferros após pesada austeridade. Tudo começou com a insolvência da cidade, que em 2013 marinava numa dívida de 300 milhões de dólares (286 milhões de euros) e numa taxa de desemprego de quase 25%.
“Os tempos mudaram”, conta ao Expresso o americano, que surgiu, nos últimos dias, em piquetes de greve promovidos pelo United Auto Workers (UAW), um dos maiores sindicatos do sector nos Estados Unidos. “O homem-guaxinim voltou”, lia-se nalguns cartazes.
Os trabalhadores não pedem emprego, mas um aumento salarial de 46% ao longo dos próximos quatro anos, cifra em linha com as benesses oferecidas aos membros das administrações dos “três grandes”: Ford, General Motors (GM) e Stellantis. “Está tudo mais caro, a comida, o combustível, o empréstimo da casa. As poupanças desapareceram”, desabafa Claudia Pedraza, vizinha de Beasley, que desde 2015 trabalha numa fábrica da GM.