O ainda Presidente dos Estados Unidos da América atirou-se à Fox News na rede social Twitter, desiludido com a estação televisiva outrora vista como sua apoiante indefetível. Numa escalada que vem pelo menos desde o dia das eleições, Trump acusa a emissora do empresário Rupert Murdoch de se ter esquecido “do que lhes deu êxito, do que os trouxe até aqui”. Conclui o chefe de Estado derrotado nas urnas: “Esqueceram-se da galinha dos ovos de ouro”.
Trump fez esta publicação após uma série em que republicava comentários de apoiantes seus contra a Fox e a favor do canal de direita Newsmax. A Fox suscitou a ira presidencial desde que foi, após as eleições de 3 de novembro, um dos primeiros canais a atribuir a Joe Biden a vitória no estado do Arizona, para depois reconhecer que o candidato do Partido Democrata venceu as presidenciais. Ainda assim, Trump reserva exceções para apresentadores da Fox mais próximos de si, como Sean Hannity e Lou Dobbs.
O Presidente cessante afirma, sem provas, que as audiências da Fox “colapsaram por completo”. O certo é que o público da Newsmax cresceu de 65 mil para 800 mil espectadores no horário nobre, segundo a agência Nielsen, citada por “The New York Times”. A sua aplicação foi a quarta mais procurada na App Store da Apple esta quinta-feira.
Trump não reconhece o resultado das eleições e a Fox tem informado os seus espectadores de que as alegações de fraude veiculadas pelo milionário não têm qualquer fundamento. Segunda-feira a estação interrompeu mesmo um direto enquanto uma porta-voz da Casa Branca repetia inverdades sobre a votação. Afirmou o pivô Neil Cavuto: “Ela está a acusar o outro lado de aceitar fraude e votos ilegais. A não ser que tenha pormenores que sustentem isso, não posso em consciência continuar a mostrar-vos isto”.
Quinta-feira duas agências ligadas à supervisão do processo eleitoral deitaram por terra quaisquer suspeitas, ao afirmarem num comuncado que “as eleições de 3 de novembro foram as mais seguras da história americana”. O Conselho Coordenador Governamental da Infraestrutura Eleitoral (GCC na sigla inglesa) e o Conselho Coordenador do Sector da Infraestrutura Eleitoral (SCC), sob a tutela da Agência de Cibersegurança e Segurança de Infraestruturas, recordam que “em todo o país, funcionários eleitorais estão a rever e a verificar todo o processo eleitoral, antes de declararem o resultado final”.
Explicam que muitos estados realizarão recontagens por haver margens curtas entre candidatos e enumeram procedimentos de segurança, para concluir que “não há prova de que qualquer sistema de votação tenha eliminado ou perdido votos, alterado votos, ou tenha sido de alguma forma comprometido”, afastando assim as “muitas alegações infundadas e oportunidades de desinformação sobre o processo” e aconselhando quem tiver dúvidas a “consultar os funcionários eleitorais, enquanto vozes fiáveis que gerem as eleições”.
“Peru cor de laranja”
Quando por fim tiver de deixar a presidência (não parecendo haver vias jurídicas viáveis para disputar a legitimidade dos resultados), Trump quererá manter-se no espaço mediático, até porque ambiciona candidatar-se às eleições em 2024. O bom resultado obtido (apesar da derrota, angariou o maior número de votos de sempre de um republicano, acima dos 70 milhões) permite-se alimentar essa esperança.
A autoproclamação como “galinha dos ovos de ouro” gerou reações mais ou menos humorísticas nas redes sociais. Do cibernauta que corrigia a imagem do Presidente para “peru cor de laranja” à que esclarecia que o que enfurece Trump é que a Fox tenha “deixado de mentir em seu favor”, passando por parágrafos sobre “psicologia dos ditadores” ou conselhos para que se dedique antes a redigir um discurso de derrota, não faltaram remoques.
Biden já garantiu 290 votos no Colégio Eleitoral, mais 20 do que o mínimo para ser eleito Presidente, num momento em que apenas falta definir o vencedor nos estados da Geórgia (16 delegados) e Carolina do Norte (15). Trump soma 217. O democrata conquistou ao republicano, por comparação com as eleições de 2016, os estados de Arizona, Michigan, Pensilvânia e Wisconsin. Além disso vai à frente na contagem da Geórgia.
Não é de crer que as recontagens que Trump possa pedir ou que sejam automaticamente ordenadas por lei (na Geórgia, onde a diferença deve ficar abaixo dos 0,5%) possam alterar o vencedor de cada estado. A margem mínima de Biden, precisamente na Geórgia, é de 14 mil votos, não havendo registo de recontagens que tenham feito mudar mais de algumas centenas de sufrágios.
O Presidente eleito granjeou quase 78 milhões de votos a nível nacional, uma vantagem de mais de cinco milhões sobre o ainda inquilino da Casa Branca. A posse de Biden e da vice-presidente eleita Kamala Harris está marcada para 20 de janeiro de 2021, ao meio-dia (17h em Portugal), em Washington.