João Carlos Pequeno tem 39 anos e dedica-se, há quase dez, a ajudar populações em situação de extrema vulnerabilidade. O Expresso conheceu-o em Beirute, quando, depois da explosão no porto da cidade, em agosto de 2020, os refugiados sírios e palestinianos, sem documentos que lhes permitissem ser atendidos no hospital, andavam pelas ruas à procura de cuidados médicos que as organizações não-governamentais disponibilizam em tendas.
Voltámos a falar com o farmacêutico, que está há dois anos no norte de França, na mata de Loon-plage. À boleia da habituação que a linguagem cria, vai aparecendo nos jornais como “campo de refugiados”, mas este espaço afastado da civilização, onde muitas vezes se dorme ao frio — porque as tendas são queimadas e rasgadas pela polícia de tempos a tempos, e o Estado não fornece comida, aquecimento, higiene ou segurança —, não é um “campo de refugiados”, diz Pequeno, responsável pela logística e angariação de fundos da No Border Medicspequena associação de médicos e enfermeiros. “São pessoas a viver na rua, nada mais.”
O destino de todos os que ali sobrevivem é só um: as praias do sul de Inglaterra. Ficam logo ali a norte, depois do Canal da Mancha. São só 34 quilómetros, frios e revoltos 34 quilómetros de mar nesta altura do ano. O Reino Unido sempre foi um país popular entre requerentes de asilo, mas o Brexit veio-lhe elevar os atributos, uma vez que, como os acordos de Dublin já não se aplicam ali, as autoridades britânicas deixaram de poder reenviar pessoas de volta ao país seguro mais próximo: França.