Coreia do Norte, Síria e Irão são três dos países que mais violam os direitos humanos, segundo as Nações Unidas. A organização assinala este sábado o 74º aniversário da adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O Conselho dos Direitos Humanos na ONU, criado em 2006 para fortalecer a promoção e a proteção dos direitos humanos no mundo e fazer recomendações sobre situações de violações, elaborou uma lista dos países com mais infrações.
Apesar de sublinhar que os direitos humanos são violados em muitos mais países e ocasiões, a entidade nomeia cinco países como os mais violadores: Coreia do Norte, Síria, Irão, Afeganistão e Arábia Saudita.
Pyongyang campeã dos abusos
O primeiro país deste ranking é a Coreia do Norte, com “uma longa história de violações dos direitos humanos”. Embora a classificação tenha em conta vários fatores, um dos mais importantes é o tratamento dado pelo Governo aos seus cidadãos.
A Comissão de Inquérito da ONU sobre Direitos Humanos na Coreia do Norte concluiu que “o regime de Kim [Jong-un] cometeu crimes contra a Humanidade, incluindo extermínios, assassínios, escravatura, tortura, violações, abortos forçados e outras formas de violência sexual, perseguições por motivos políticos, religiosos, raciais e de género e transferências forçada de populações”.
Pyongyang mantém campos de prisioneiros onde os detidos são deixados à fome até morrerem, forçados a trabalhar em situações perigosas e sujeitos a violência sistemática, além de realizar com frequência execuções públicas para intimidar, sobretudo, quem tenta fugir do país. O regime controla todas as informações que entram e saem do país, omitindo qualquer dificuldade ou crítica ao país e até inventando cenários favoráveis. Proíbe-se qualquer atividade religiosa não autorizada, prendendo ou executando aqueles que desobedecem.
A Coreia do Norte também restringe a liberdade de movimento no país, tornando difícil a fuga aos abusos. Vários relatos dão conta de tráfico de pessoas para trabalhos forçados em países como a China e a Rússia e exploração sexual de mulheres e meninas.
Guerra civil, destruição e êxodo
Na lista dos países onde os direitos humanos são mais ignorados está ainda a Síria. A ONU sublinha que os abusos estão “bem documentados e incluem assassínios, tortura, prisões e detenções arbitrárias e desaparecimentos forçados”. Segundo a organização, o Governo sírio foi repetidamente acusado de restringir a liberdade de expressão, de reunião e de religião, além de impedir ajuda humanitária aos necessitados.
As violações dos direitos humanos na Síria acontecem há muitos anos, mas a situação piorou desde o início da guerra civil, em 2011. Segundo a Amnistia Internacional, mais de 100 mil pessoas foram mortas no conflito e mais de quatro milhões fugiram.
O regime de Damasco, liderado por Bashar Al-Assad, foi acusado de crimes contra a Humanidade, incluindo armas químicas contra civis, bombas e munições de fragmentação (proibidas pelo direito internacional), além de atos de tortura e execução de trabalhadores humanitários e médicos. A guerra civil provocou uma enorme crise humanitária, com mais de 13 milhões de pessoas a precisar de ajuda. Ainda criou terreno fértil para grupos terroristas, como o Daesh (autoproclamado Estado Islâmico).
República Islâmica executa sumariamente
Outro país focado é o Irão. “O regime é culpado de violações dos direitos humanos por uma série de razões, a começar pelas execuções e detenções de dissidentes políticos e jornalistas críticos”, acusam as Nações Unidas. Além disso, a teocracia “pratica tortura e outras formas de tratamento cruel e desumano dos detidos, e nega aos seus cidadãos direitos básicos como liberdade de expressão e reunião”.
Até há poucos dias, o Irão mantinha uma polícia da moralidade responsável pelo cumprimento do rígido código de vestuário feminino do país. Após meses de protestos, na sequência da morte da jovem Mahsa Amini, sob custódia desta força policial, a extinção da polícia da moralidade foi anunciada, mas mantêm-se as dúvidas sobre o fim das práticas de perseguição por incumprimento dos costumes e moral.
Esta onda de protestos inédita no Irão desde a Revolução Islâmica de 1979 tem sido fortemente reprimida pelas autoridades. Haverá, denunciam organizações não-governamentais, mais de 500 mortos e milhares de detidos, alguns dos quais condenados à morte em julgamentos sumários, e executados.
Entre os cinco maiores violadores de direitos humanos está também o Iraque. A ONU diz que a situação no país é, “há muitos anos, considerada uma das mais terríveis”. Segundo a Amnistia Internacional, estão documentados muitos casos, incluindo execuções extrajudiciais, tortura, detenções arbitrárias, falta de julgamentos e deslocamentos forçados de milhares de pessoas.
O Governo iraquiano nunca responsabilizou os autores de violações dos direitos humanos e as forças de segurança continuam a cometê-las com impunidade. “A situação tem-se deteriorado desde 2014.”
O grupo jiadista Daesh provocou uma ampla gama de abusos, mas as forças do Governo iraquiano e as milícias afiliadas, bem como o governo regional curdo, foram acusados de graves violações. Contam-se milhares de mortos e feridos entre a população civil.
O regresso dos talibãs
O Afeganistão é outro exemplo avançado pela ONU. Apesar de o país ser atormentado por violência há muitos anos, “a situação deteriorou-se profundamente depois do regresso ao poder dos fundamentalistas talibãs”, em agosto de 2021. Em setembro passado, o relator da ONU no Afeganistão concluiu que o país enfrenta uma profunda crise de direitos humanos e destacou “a severa reversão dos direitos das mulheres e meninas, as represálias contra opositores e críticos, os ataques a minorias e a repressão da imprensa”.
Segundo o especialista, em nenhum outro país as mulheres e meninas perderam tanto e tão depressa os seus direitos na vida pública. Deixaram de ter direito à educação, à liberdade de expressão, à escolha sexual ou até à vida. A mesma fonte adianta que “é frequente haver ataques contra a população civil, incluindo assassínios por vingança de ex-funcionários do Governo que apoiou as forças ocidentais”, entre 2001 e 2021.
“Apesar de os talibãs terem declarado uma amnistia no início da tomada de poder, as ex-forças de defesa e segurança nacional afegãs continuam a ser responsáveis por centenas de execuções extrajudiciais e desaparecimentos forçados”, alerta a ONU. A independência jornalística e a liberdade de expressão são cada vez mais restringidas e o acesso a informação livre é quase impossível.
Por fim, a lista das Nações Unidas refere a Arábia Saudita, onde “os abusos dos direitos humanos estão descontrolados e incluem torturas, detenções arbitrárias e execuções”. Segundo as organizações de defesa dos direitos humanos, as mulheres e pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgénero) são particularmente vulneráveis, mas o Governo é sobretudo conhecido por reprimir qualquer forma de dissidência.
Também aqui as mulheres são vítimas de forte discriminação, que o regime saudita justifica com o seu caráter islâmico especial. A Arábia Saudita é dos países onde a perseguição religiosa e política é mais forte e é extremamente difícil a existência de ativistas ou manifestações contrárias ao regime, que se mantém como um dos únicos no mundo a não aceitar a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU.