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Afeganistão. Restrições dos talibãs impostas às mulheres estão “contra o Islão”

Na última vez que os talibãs governaram no Afeganistão, as mulheres estiveram sujeitas a uma longa lista de proibições: não podiam estudar ou trabalhar e nem sequer sair à rua sozinhas. Com o grupo novamente no poder, as afegãs receiam perder os direitos que conquistaram nos últimos 20 anos. Os talibãs prometeram que as mulheres vão ser muito ativas na sociedade, mas "dentro do quadro do Islão". David Munir, o imã da Mesquita Central de Lisboa, diz que estas restrições nada têm a ver com o Islão — têm a ver com a cultura e tradição dos pachtuns
FARSHAD USYAN/GETTY IMAGES

Com os talibãs no poder, os direitos das mulheres conquistados nos últimos 20 anos — como estudar, trabalhar e ocupar cargos públicos — estão em risco. As afegãs receiam o regresso das restrições impostas no anterior regime do movimento fundamentalista, que governou o país entre 1996 e 2001.

Agora, o grupo está a tentar passar uma imagem mais moderada e tolerante à comunidade internacional. Logo na primeira conferência de imprensa, o principal porta-voz, Zabihullah Mujahid, assegurou que “as mulheres vão ser muito ativas na sociedade, mas dentro do quadro do Islão”.

O sheik David Munir, imã da Mesquita Central de Lisboa, afirma que o Islão não proíbe e nunca proibiu a independência da mulher. Ao Expresso, explica que as restrições que estiveram em vigor no último regime talibã 一 e que se receia que voltem agora 一 não têm nada a ver com a religião, mas com a tradição e a cultura dos talibãs, que são na maioria pachtuns (grupo etnolinguístico).

Uma das regras que foi imposta entre 1996 e 2001, quando os talibãs estavam no poder, ditava que as mulheres não podiam trabalhar fora de casa, à exceção de um número reduzido de médicas e enfermeiras e apenas em alguns hospitais de Cabul, a capital. “De acordo com a tradição e cultura pachtun, a mulher não pode trabalhar, fica em casa. É assim que eles cresceram, é assim que eles educam, é assim que eles estão habituados”, diz o imã da Mesquita Central de Lisboa.

A esta restrição juntam-se pelo menos mais 28. A Associação Revolucionária das Mulheres do Afeganistão enumerou toda a lista de regras “que as mulheres afegãs são forçadas a levar sob o regime talibã”, lê-se na página oficial. Ainda não é certo que restrições é que o grupo vai impor agora, mas estas foram as que vigoraram no último governo.

Outra das regras que mais se receia que volte é a proibição de as mulheres estudarem em escolas, universidades ou qualquer outra instituição de ensino. Como explica David Munir, o acesso à educação é muito limitado porque a mulher não vai trabalhar na cultura pachtun. “Acho que eles querem ainda manter essa tradição que vem já de há anos”, reflete.

No anterior Emirado Islâmico do Afeganistão, as mulheres não podiam sair de casa sem a burqa — o véu que cobre da cabeça aos pés, só com uma pequena rede na zona dos olhos. Também não podiam sair sem o pai, o marido ou o irmão, por exemplo, ou fazer qualquer atividade fora de casa sem o acompanhante masculino. As privações eram mesmo muitas: as mulheres estavam proibidas de rir em voz alta ou de usar saltos altos que fizessem barulho ao caminhar.

Agora, o movimento fundamentalista está a tentar passar uma imagem de abertura. Na primeira conferência de imprensa, dois dias depois de ter ocupado o Palácio Presidencial, o grupo afirmou que as mulheres terão direito à educação e ao trabalho. No entanto, não é claro como ficam os direitos das afegãs sob um novo governo talibã.