O Acordo de Comércio e Cooperação pós-Brexit negociado entre o Reino Unido e a União Europeia (UE) foi concluído em dezembro, já em cima da data limite, entrando em vigor de forma provisória em janeiro de forma a evitar o caos nas relações entre os dois lados do Canal da Mancha. Agora, que o prazo para a ratificação está a chegar ao fim, o Parlamento Europeu foi a votos para dar o seu consentimento.
O resultado da votação só será conhecido amanhã, quarta-feira, mas a maioria dos eurodeputados está a favor da ratificação, garantindo que o acordo de parceria não volta para trás nem cai por terra. No entanto, os eurodeputados deixaram vários avisos a Boris Jonhson sobre as medidas que podem ser usadas pela União, caso o país continue a violar os compromissos assumidos, como tem vindo a acontecer com o Acordo de Saída, nomeadamente em relação ao protocolo das Irlandas.
Durante o debate no plenário, em Bruxelas, a presidente da Comissão Europeia apelou à ratificação do tratado, argumentando que isso dará à UE "os instrumentos para assegurar o total cumprimento das obrigações assinadas pelos dois lados". Ursula von der Leyen garante que “não hesitará” em acionar as medidas legais em caso de falhas.
Desde janeiro, são várias as falhas nos controlos de bens que circulam entre a Irlanda do Norte e a Grã-Bretanha, o que levou a presidência portuguesa do Conselho a defender o pleno respeito do protocolo sobre a Irlanda do Norte, considerando ser "fundamental" para a estabilidade das futuras relações entre UE e Reino Unido.
No Parlamento Europeu, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, começou por saudar o fim de "um período muito intenso de quatro anos" de negociações, considerando que este acordo de comércio "protege os interesses europeus e assegura a concorrência leal, bem como a cooperação contínua em áreas de interesse mútuo".
No entanto, também sublinhou que permanecem questões por resolver: "a UE deve continuar empenhada no Acordo de Sexta-Feira Santa e com o povo da Irlanda do Norte. A implementação do Protocolo sobre a Irlanda e Irlanda do Norte é um passo fundamental para trazer estabilidade às relações entre a UE e o Reino Unido. Este deve ser um esforço conjunto, sem espaço para ações unilaterais", alertou a secretária de Estado Ana Paula Zacarias.
O debate no hemiciclo foi, por isso, pontuado por avisos dirigidos ao Reino Unido.
"Hoje, quando vemos a implementação do Protocolo para a Irlanda do Norte e como se porta Boris Johnson, a mensagem que ele passa é: "não quero saber, não quero saber sequer o que assinei. É o novo Reino Unido que temos como parceiro", disse o líder da bancada do Partido Popular Europeu, o alemão Manfred Weber.
O vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Šefčovič, tem estado em diálogo com os britânicos, com vista a garantir que os compromissos são cumpridos. "Tem feito algum progresso; temos assistido a uma nova dinâmica construtiva”, disse Ursula von Der Leyen, defendendo a ratificação do acordo. E se colocou água na fervura, também não deixou de alertar que há medidas que podem ser tomadas caso o Reino Unido continue a falhar.
Foco nas soluções conjuntas
“Há medidas legais, deixem-me ser muito clara. Nós não queremos ter de usar estas ferramentas, mas não hesitaremos em usá-las se necessário, se o acordo não for cumprido”, avisou a líder do executivo comunitário.
“Precisamos de soluções não de ‘soundbites’, para que o protocolo [para a Irlanda do Norte] funcione”, acrescentou.
Tal como Ana Paula Zacarias, também Von der Leyen insistiu que o foco tem de apontar para soluções conjuntas. “As decisões unilaterais não nos levam a lado nenhum. E esta é uma das razões pelas quais a ratificação é tão importante”, reforçou.
A Irlanda do Norte é uma preocupação para os eurodeputados que se questionam sobre se o Reino Unido respeitará o Acordo de Comércio, quando não respeita o Acordo de Saída. Malik Azmani, eurodeputado do Renovar Europa, insistiu nos alertas: "se o Governo britânico não respeitar os compromissos, não hesitaremos em tomar as medidas necessárias".
A eurodeputada e líder dos Socialistas e Democratas, Iratxe García, agradeceu a Šefčovič “o enorme esforço que está a fazer para alcançar um acordo amigável”, mas não deixou de lhe fazer o mesmo pedido: “Se Londres continuar a incumprir os controlos fronteiriços, siga em frente com os instrumentos que temos a partir de agora".
A 24 de dezembro de 2020, os negociadores da UE e do Reino Unido chegaram a um consenso sobre o Acordo de Comércio e Cooperação que estabelece os termos da futura cooperação bilateral. Para minimizar as perturbações, o acordo foi aplicado provisoriamente desde 1 de janeiro de 2021. A aprovação do Parlamento Europeu é necessária para que o tratado entre em vigor definitivamente antes de caducar, a 30 de abril de 2021.