Internacional

Guiné-Bissau: eleições antecipadas ou coabitação?

Tendo conseguido reconhecimento internacional, o autoproclamado Presidente Úmaro Sissoco Embaló tem de decidir entre manter o atual Governo de iniciativa presidencial ou devolver a governação ao PAIGC, maior força política do país

Sissoco
Christophe Van Der Perre/Reuters

Fernando Jorge Pereira, em Bissau

Cerca de uma semana após ter recebido a bênção da Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO, formada por 15 membros), que tutela a mediação da crise na Guiné-Bissau, o Presidente Úmaro Sissoco Embaló reuniu-se, terça-feira, com os principais parceiros internacionais e, quarta-feira, com partidos políticos com assento parlamentar.

O encontro de terça foi o primeiro do novo homem-forte da Guiné-Bissau com os chamados P5, isto é, os representantes em Bissau das Nações Unidas, União Europeia, União Africana, CEDEAO e Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).

A audiência não foi surpresa, uma vez que dias antes todas estas organizações se acomodaram com a iniciativa da CEDEAO de reconhecer Sissoco como chefe de Estado, sem esperar pelo veredicto do Supremo Tribunal de Justiça guineense. O Presidente foi eleito a 29 de dezembro com 53,6% dos votos, mas o candidato derrotado na segunda volta, Domingos Simões Pereira, contesta os resultados.

Os diplomatas estrangeiros manifestaram disponibilidade para ajudar o país e reforçar a cooperação. A delegada da UE em Bissau, a portuguesa Sónia Neto, disse ter tido “uma boa conversa” com Sissoco. O representante da União Africana, o são-tomense Ovídio Pequeno, afirmou que nesta primeira abordagem trocaram impressões sobre “o que poderá ser o futuro desenvolvimento do país e o que se espera dos P5 para garantir a paz e a estabilidade” do país.

A surpresa foi a presença do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC, maior força política do país) no Palácio da República, o que equivale a um reconhecimento tácito da autoridade presidencial. Até agora o PAIGC via Sissoco como “um candidato presidencial”, que chegou ao poder graças a “um golpe de Estado perpetrado à luz do dia”, em referência à sua investidura, realizada a 27 de fevereiro último, num hotel da capital, à margem do protocolo oficial e sob forte proteção militar.

Fonte do PAIGC explicou esta posição ao Expresso com o facto de o partido ser “contra a política de cadeira vazia”. A segunda vice-presidente do PAIGC, Odete Semedo, foi mais objetiva e declarou à saída do encontro com Sissoco, que o PAIGC “está interessado a ser parte da solução dos problemas da Guiné-Bissau”, por ter vencido as legislativas de março de 2019. O seu programa de governo foi sufragado na Assembleia Nacional Popular (ANP, Parlamento guineense, com 102 membros).

O primeiro-ministro Aristides Gomes, nomeado na sequência daquelas eleições, foi destituído por Sissoco, que indigitou para o cargo Nuno Gomes Nabiam. Dos 102 deputados, 47 são do PAIGC.

O dilema do Presidente

A CEDEAO deu a Sissoco o prazo de um mês, até 22 de maio, para formar novo Executivo, em conformidade com a Constituição e com base no resultado das últimas eleições legislativa. Se assim for, é o PAIGC que deverá ser chamado a designar o primeiro-ministro, já que detém a maioria dos assentos parlamentares.

Sissoco já disse, porém, que o que recebeu da CEDEAO “foram conselhos”, e não esconde a intenção de dissolver a Assembleia, se esta chumbar o programa do Governo por si nomeado. Estará convencido de que convocando novas eleições poderá constituir uma maioria presidencial.

Nabiam lidera a Aliança Povo Unido, que tem apenas cinco deputados. O seu Executivo é apoiado pelo Movimento para a Alternância Democrática (Madem-15), de Sissoco, pelo Partido da Renovação Social (PRS), segunda e terceira forças políticas guineenses.

Quatro parlamentares do partido do primeiro-ministro votaram a favor do PAIGC, que tem o apoio de mais duas pequenas formações (Nova Democracia e União pela Mudança; este último, encabeçado pelo ex-jornalista Agnelo Regalla, boicotou o encontro com Sissoco). Neste cenário Sissoco tem pouca margem de manobra. Ou devolve a governação ao PAIGC ou desafia a CEDEAO, fonte da sua legitimação internacional.