Obrigaram-nos a despirem-se, foram espancados e não lhes foi permitido pedir asilo ou chamar um representante legal que os defendesse. Tudo isto aconteceu num centro de detenção secreto em Poros, relata o jornal norte-americano “The New York Times”. A investigação publicada esta terça-feira conta ainda a história de Somar al-Hussein, um sírio curdo que conseguiu atravessar ilegalmente a fronteira e entrar na Europa. Esteve apenas uma hora na Grécia, foi apanhado pelas autoridades e levado para o tal centro de detenção.
Somar apenas percebeu onde estava graças à localização do telemóvel: Poros, uma vila grega no sul da fronteira terrestre entre a Turquia e a Grécia, que fica a cerca de 100 quilómetros de Kastanies, um dos locais mais comuns de passagem e onde as tensões entre migrantes e autoridades têm sido maiores. Descreve o sírio que o local era apenas composto por três armazéns de telhado vermelho, que entre eles formavam um U. Só ali se chegava por uma estrada pelo meio do campo. Do lado de fora, centenas de outros migrantes esperavam. Somar foi levado para o interior de um dos edifícios, o telemóvel foi então confiscado e foram-lhe recusados todos os pedidos de asilo assim como o contacto com funcionários das Nações Unidas.
“Para eles, éramos animais”, disse ao “New York Times” Somar, referindo-se às autoridades gregas. Somar é engenheiro informático e numa noite atravessou o rio Evros - que divide o território turco e grego: entrou num barco de borracha cheio com outras pessoas e horas depois estava na Europa.
Nos armazéns, o grupo ficou uma noite sem água ou comida. E no dia seguinte o sírio e dezenas de outros migrantes foram levados novamente até ao rio Evros, postos dentro de um barco e deixados na Turquia.
A publicação norte-americana explica que ouviu vários relatos como este, escolhendo publicar o de Somar por ser o mais detalhado. Ao cruzar as várias referências e as descrições dadas, o “New York Times” conseguiu localizar o local certo do centro de detenção extrajudicial. Além de uma fonte próxima de antigos militares gregos que confirmou a existência do local, três jornalistas foram impedidos de passar junto àquele local. Também a Respond, um grupo de investigação sueco garantiu que o sítio existe.
Os armazéns não estão classificados como um local de detenção, embora estejam a ser usados informalmente durante os períodos em que o fluxo migratório é maior.
A descoberta do jornal norte-americano surge num momento em que as autoridades gregas têm sido acusadas, sobretudo pelas autoridades turcas, de estarem a recorrer a formas de violência para travar os migrantes e refugiados que tentam entrar na Grécia. Aliás, a Turquia aponta responsabilidades à Grécia relativamente à morte de pelo menos três pessoas junto à fronteira - uma acusação que é negada por Atenas.
Desde que a Turquia passou a permitir a passagem de migrantes e refugiados pelo seu lado da fronteira que milhares de pessoas se juntaram em Edirne à espera da sua vez de entrar na Europa. Nos primeiros dias registaram-se fortes conflitos com a polícia grega, que reforçou a segurança do lado europeu da fronteira. Há relatos - e imagens - do uso de gás lacrimogéneo e de tiros disparados para o ar com o objetivo de controlar a multidão.