O Presidente da Índia, Ram Nath Kovind, anunciou a revogação do artigo 370 da Constituição, que conferia um estatuto especial à região de Jammu e Caxemira. “O Presidente, por recomendação do Parlamento, tem o prazer de declarar que, a partir de 6 de agosto de 2019, todas as cláusulas do artigo deixarão de se aplicar”, revelou uma notificação oficial, citada esta quarta-feira pelo India Today.
O Parlamento aprovou na terça-feira a mudança de estatuto do estado de Jammu e Caxemira, uma região de maioria muçulmana disputada com o Paquistão. O projeto de lei, aprovado pela Lok Sabha (a câmara baixa do Parlamento), altera o seu estatuto administrativo de estado para território da união. Na prática, isto significa que Jammu e Caxemira passará a ser administrado diretamente por Nova Deli e já não terá a autonomia sobre assuntos locais de que gozava.
A remota região montanhosa de Ladaque, atualmente parte daquele estado, também será separada e transformada num território de união autónomo.
O projeto de lei passou com 370 votos a favor e 70 contra. A Rajya Sabha, a câmara alta do Parlamento, já o tinha aprovado na véspera. Mas os deputados da oposição e alguns analistas denunciam a medida como potencialmente ilegal e dizem que poderá acabar no Supremo Tribunal de Justiça.
Não-residentes passam a poder comprar propriedades
Reivindicada na sua totalidade pela Índia e pelo Paquistão, Caxemira está no centro de uma disputa territorial violenta há mais de 70 anos, que já provocou duas guerras entre os dois vizinhos com armas nucleares.
O estado de Jammu e Caxemira, que abrange a área de Caxemira controlada pela Índia, beneficiava de um estatuto especial desde 1949 que incluía o poder de ter a sua própria Constituição, bandeira e autonomia em todas as matérias, exceto na defesa, relações exteriores e comunicações.
A alteração de estatuto permitirá que não-residentes comprem propriedades e concorram a empregos e bolsas de estudo que antes estavam reservadas aos residentes do estado. A revogação da autonomia era uma promessa antiga do Partido do Povo Indiano (nacionalistas hindus), do primeiro-ministro Narendra Modi, que garantiu um sólido segundo mandato nas eleições de abril e maio.
Modi quer limpeza étnica dos muçulmanos, acusa Khan
O primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan, classificou a medida como ilegal e disse que o seu Governo pressionaria o Conselho de Segurança da ONU sobre o assunto, estando igualmente a avaliar se o Tribunal Internacional de Justiça poderia intervir. Em declarações na Assembleia Nacional do seu país, Khan disse que a ideologia do partido de Modi corresponde à limpeza étnica dos muçulmanos da Índia. “Se o mundo não agir agora, se o chamado mundo desenvolvido não defender as suas próprias leis, então a situação evoluirá para um ponto que irá danificar o mundo inteiro”, sublinhou.
Nos dias que antecederam o anúncio da revogação, foram mobilizadas dezenas de milhares de tropas adicionais para a Caxemira administrada pela Índia e vários políticos foram colocados em prisão domiciliária, incluindo pelo menos dois antigos ministros estaduais. O estado continua bloqueado com um apagão que deixou muitas pessoas sem acesso à Internet e a serviços telefónicos, além de vigorar uma proibição de reuniões públicas.