O Governo indiano anunciou esta segunda-feira a revogação da autonomia constitucional de Caxemira, região há muito disputada com o Paquistão. Os nacionalistas hindus, no poder, aprovaram um decreto abolindo o estatuto especial do estado de Jammu e Caxemira, que era garantido pela Constituição da Índia.
O anúncio foi feito no Parlamento pelo ministro da Administração Interna, Amit Shah, perante os protestos da oposição. O decreto “entra em vigor imediatamente e substitui” os artigos constitucionais sobre aquele estado, em particular o artigo 370, de acordo com um texto divulgado pelo Governo.
Era aquele artigo da Constituição que conferia um estatuto especial a Jammu e Caxemira e previa que Nova Deli só legislasse em matéria de defesa, relações exteriores e comunicações, ficando o resto para a Assembleia Legislativa local.
Projeto de lei para dividir Jammu e Caxemira
O Governo de Narendra Modi também apresentou um projeto de lei no Parlamento para dividir Jammu e Caxemira. Segundo a proposta, a parte oriental de maioria budista, Ladaque, será separada, enquanto as partes restantes, que incluem as planícies de maioria hindu de Jammu no sul e o vale de Srinagar de maioria muçulmana no norte, perdem o estatuto de estado federado. Na prática, isto significa que a região passa a ser considerada “território da União”, ficando sob a administração direta de Nova Deli.
A revogação da autonomia de Caxemira era uma promessa antiga do Partido do Povo Indiano, que garantiu um sólido segundo mandato nas eleições de abril e maio.
Paquistão diz que “pode haver guerra”
O ministro dos Negócios Estrangeiros do Paquistão, Shah Mahmood Qureshi, rejeitou a revogação da autonomia constitucional da Caxemira pela Índia, alegando que a medida viola uma resolução das Nações Unidas.
Qureshi disse esta segunda-feira na televisão paquistanesa - a partir da Arábia Saudita, onde se encontra em peregrinação a Meca - que o Paquistão vai aumentar os esforços diplomáticos para impedir que a revogação da autonomia constitucional da Caxemira, determinada por ordem presidencial, entre em vigor.
O presidente da Caxemira controlada pelo Paquistão, Sardar Masood Khan, também rejeitou a ordem presidencial e disse que a Índia "pode entrar em guerra" com o Paquistão em tal situação.
“Ameaças terroristas sinalizadas”
As comunicações estão totalmente interrompidas desde manhã na região, para onde Nova Deli mobilizou dezenas de milhares de tropas adicionais nos últimos dias e colocou políticos locais em prisão domiciliária. No domingo, as autoridades da Caxemira indiana tinham decretado “uma proibição total de ajuntamentos e reuniões públicas” em Srinagar (a principal cidade do território e a capital estadual durante o verão) e nos arredores e ordenado que as escolas e universidades fossem encerradas no estado até novo aviso.
Na sexta-feira, o Governo estadual havia apelado aos turistas e peregrinos para deixarem “imediatamente” o território devido às “ameaças terroristas sinalizadas pelos serviços de informação”. No dia seguinte, milhares de turistas, peregrinos e estudantes tentavam deixar Caxemira de avião ou por estrada.
Mais de 70 mil soldados adicionais
A Índia e o Paquistão disputam Caxemira desde a divisão do território colonial britânico, em 1947, e já se defrontaram em duas guerras por causa desta região. Os exércitos indiano e paquistanês trocam tiros de morteiro quase todos os dias ao longo da linha de cessar-fogo. Uma insurreição separatista ocorre desde 1989 na Caxemira administrada pela Índia, tendo já custado a vida a mais de 70 mil pessoas, sobretudo civis. Nova Deli acusa Islamabade de apoiar grupos rebeldes mas o Paquistão nega.
As tensões aumentaram nos últimos dias com a mobilização de tropas indianas para o território. Segundo uma fonte de segurança citada pela agência France-Presse, mais de 70 mil soldados adicionais foram mobilizados nos últimos dias, um aumento considerado sem precedentes.