Pedir à União Europeia para adiar o Brexit, sim ou não e em para quê. Eis a questão principal colocada esta quinta-feira à apreciação dos deputados britânicos, que debate ao longo da tarde uma moção apresentada pela primeira-ministra nesse sentido. A oposição propôs várias emendas ao texto, uma das quais prevê que o tempo adicional obtido seja usado para organizar um novo referendo sobre a saída ou permanência na UE.
Chumbado na terça-feira o acordo que Theresa May alcançara com Bruxelas e recusada, quarta-feira, a ideia de sair da UE sem acordo, o pedido de adiamento tem todas as condições para ser aprovado pela Câmara dos Comuns, mas dependerá da autorização dos 27, que terá de ser unânime.
O texto proposto pelo Governo indica que a dirigente conservadora não dá por morto e enterrado o plano que o Parlamento já chumbou por duas vezes. Em janeiro foram 432 deputados a votar contra e 202 a favor; terça-feira, 391 contra e 242 a favor. May pode ter esperança de que o aproximar da data de saída presentemente consagrada na lei — 29 de março às 23h — faça mais deputados mudar de posição, a seu favor, mas a montanha que precisa de escalar ainda é grande: uma desvantagem de 149 votos.
Para acrescentar a essa pressão, o Executivo prevê na sua moção que caso haja um acordo aprovado até 20 de março, o pedido de prorrogação irá apenas até 30 de junho e terá caráter eminentemente técnico. Caso contrário, Londres terá de pedir um adiamento mais longo, obrigando o Reino Unido a participar nas eleições europeias de maio (isto porque o Parlamento Europeu então eleito tomará posse a 2 de julho e é obrigatório que contenha deputados de todos os Estados que então estiverem na UE).
“O mais tarde que pode ir um adiamento sem participarmos nas eleições europeias é 30 de junho”, sublinhou, no debate que decorre, David Lidington, o deputado conservador que exerce um cargo equivalente ao de ministro da Presidência e é visto como vice de May. A seu ver, seria complicado os britânicos serem chamados a escolher eurodeputados quase três anos depois de terem escolhido, no referendo de 2016, sair da UE.
Emendas às emendas
Além da moção governamental, vão a debate quatro propostas de emenda à mesma. Uma delas pede um adiamento que permita realizar novo referendo ao Brexit. Foi iniciativa do Grupo Independente, formado por oito deputados saídos do Partido Trabalhista e três que abandonaram o Partido Conservador, todos eles europeístas. O speaker da Câmara dos Comuns, John Bercow, a quem cabe conduzir os trabalhos, enfureceu a ala eurocética do Parlamento ao não escolher para debate uma emenda que proibia uma segunda consulta popular.
Outra emenda, proposta pelo trabalhista Hilary Benn, pede que na próxima quarta-feira, 20 de março (o prazo em que May queria ver um acordo aprovado), os deputados possam organizar votações indicativas sobre várias opções para sair do atual impasse (ao abrigo do complexo processo parlamentar, também foi proposta uma emenda a esta emenda, sugerindo que tais votações se realizem, mas noutro dia).
Seria questão de debater e votar hipóteses que vão de novo referendo à revogação do Brexit, passando por eleições antecipadas ou por uma versão do Brexit que não a da primeira-ministra. Lidington indicou no debate que o Executivo não punha de parte tais votações indicativas. Não havendo acordo até dia 20, explicou, o adiamento seria longo e o Governo reconheceria, prometeu, “que a Câmara dos Comuns precisará de tempo para ponderar potenciais rumos”. Seria, disse, nas duas semanas posteriores ao Conselho Europeu de final de março.
Há ainda uma emenda apresentada pelo líder trabalhista, Jeremy Corbyn, a favor de uma abordagem diferente ao Brexit. O maior partido da oposição tem defendido uma saída mais suave, em que o Reino Unido permanece na união aduaneira. Já o deputado trabalhista Chris Bryant sugere que seja proibido Theresa May voltar a apresentar à Câmara dos Comuns o plano duas vezes chumbado.
Saída sem acordo ainda é possível
A Câmara dos Comuns encara as consequências das opções recentes que tomou. A rejeição da saída sem acordo, ontem aprovada, não tem força de lei. Para evitar uma saída sem acordo, o Parlamento tem de aprovar um acordo de saída ou desistir do Brexit, sendo que esta opção não está em cima da mesa e seria politicamente inviável sem passar pelas urnas.
Tudo indica que o adiamento será aprovado na votação marcada para as 17h. Os termos em que o for influenciarão a resposta de Bruxelas, mas as instituições europeias têm indicado que um putativo pedido para atrasar o Brexit terá de ter uma “justificação credível”. Para evitar a saída sem acordo, alertou a Comissão Europeia na quarta-feira, “não basta votar contra uma saída sem acordo”. A UE continua disposta a ratificar o acordo que firmou com May em novembro.
“O Reino Unido tem de nos dizer o quer para a relação futura, qual é a sua escolha. É a questão que se coloca agora e para a qual precisamos de uma resposta”, insistia esta semana o negociador-chefe da UE para o Brexit, Michel Barnier. Um porta-voz do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, é claro: “Os 27 esperam uma justificação credível para uma possível extensão e a respetiva duração”.