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Menos de 400 casas até €200 mil à venda em Lisboa

Habitação. Análise ao mercado conclui que as casas mais procuradas — em preço, tipologia e localização — são as que há menos para venda. Por isso é que os preços das habitações subiram e não se antecipa que desçam no curto prazo

Para Luís Marques Mendes, a habitação em Portugal precisa de um “esforço de entendimento alargado” e de políticas que atravessem várias legislaturas

Quando começaram a fazer o estudo “Habitação em Portugal: O Que Mudou nos Últimos Anos”, a Century 21, a Vida Imobiliária e a Strategik B&F Consulting fizeram um levantamento das casas disponíveis no mercado a nível nacional — e não só na base de dados da mediadora — e o resultado foi surpreendente. Por exemplo, diz o CEO da Century 21, Ricardo Sousa, “na cidade de Lisboa há 400 casas à venda até €200 mil”, o valor máximo que as famílias portuguesas estão disponíveis para pagar quando procuram casa, segundo as conclusões do estudo (ver coluna ao lado). “É mesmo muito pouco”, repara, alertando ainda que, como há sempre casas repetidas nos vários portais de pesquisa, este número é “seguramente” inferior.

Além disso, a maior parte destas 400 casas são T0 e T1 ou casas em mau estado, ou seja, também não são aquilo que os portugueses procuram neste momento em termos de área e tipo de imóvel. De acordo com o estudo, a maior parte da procura recai sobre T3 com 91 m2 a 150 m2 usados, mas em bom estado.

“O nosso estudo põe em evidência que o hiato entre oferta e procura é cada vez maior”, frisa Ricardo Sousa. E em tudo o que é relevante na procura de casa: preço, localização, tipo e estado do imóvel, características e envolvente. Por exemplo, foram identificadas ofertas até €200 mil, “mas não é onde se quer”, o que quer dizer que estão fora das cidades. Também encontram casas com as áreas pretendidas nos subúrbios, mas que custam mais de €300 mil. E identificam ainda habitações novas, tanto no centro como fora dele, que custam mais de €200 mil e não têm as características pretendidas.

“Constrói-se de uma forma um pouco aleatória e sem olhar às necessidades das pessoas. A relação com a casa mudou”, repara o CEO, mas salientando que os promotores também estão limitados naquilo que podem fazer.

Não só porque os planos diretores municipais (PDM) e o Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), que data de 1951, “são antigos”, mas também por causa da burocracia excessiva. “Continuo a ver que o receio dos promotores leva a que comprem um terreno já com projeto aprovado e que não o alterem, porque qualquer mudança vai demorar muito tempo a ser licenciada, pelo que optam pelo projeto que está aprovado, mesmo sem estar alinhado com a realidade atual”, nota.

Preços não descem

Com este desequilíbrio entre oferta e procura, em que não só faltam casas como as que existem não estão adequadas ao que as famílias querem, a perceção de quem trabalha no mercado é de que os preços não vão descer no curto prazo. Porque tudo o que é mais urgente leva tempo a fazer.

Desde logo “é preciso aproximar as pessoas da oferta que existe, e isso faz-se através de uma melhor rede de transportes”, que exigem uma nova política de mobilidade urbana. E é preciso aumentar a oferta, porque só se estão a construir 17 mil casas por ano em Portugal, bem menos do que as 70 mil que se construíam nos anos 90.

Mas construir ou reabilitar uma habitação leva vários anos, mesmo com a aprovação do Simplex do licencia­mento de obras, que, entre outras medidas, obriga as autarquias a serem mais céleres e a darem as licenças num prazo máximo de 200 dias. É que este pacote legislativo foi aprovado em janeiro deste ano e só entra em vigor a 4 de março, e por isso “ainda vai demorar a produzir efeitos”, repara o administrador do Santander, Miguel Belo de Carvalho, um dos participantes na conferência que a Century 21 e a Impresa organizaram em Lisboa.

Acresce ainda que fazer habitações novas está mais caro, por via do aumento dos preços dos materiais e da mão de obra. “O custo de construção está nos €1300 por mero quadrado, sem impostos nenhuns e sem custos de contexto”, diz Ricardo Sousa.

Ou seja, só a obra de uma casa de 100 m2 custa €130 mil ao promotor, e juntando o IVA sobre a construção, a 23%, ultrapassa logo os €150 mil. Mas, antes, esse promotor teve de comprar o terreno e pagar impostos sobre essa transação, teve custos com licenças e projetos e tem de pagar impostos pela propriedade do terreno e ainda os custos do crédito pedido ao banco, sujeito às atuais taxas de juro. Tudo junto, só o custo de construção pode chegar aos €200 mil e, portanto, o promotor terá de cobrar mais para poder ter lucro.

De acordo com o CEO do Confidencial Imobiliário, Ricardo Guimarães, o que se antecipa no curto e médio prazo é uma estabilização dos preços por via da descida das taxas de juro, esperada já para este verão. Por outras palavras: com taxas mais baixas, os promotores pagam menos pelo crédito que pedirem para construir. Ainda assim, para muitos dos agentes do mercado uma das formas de aumentar a oferta passa por aliviar os impostos sobre a construção.

O programa Mais Habitação traz medidas nesse sentido, mas tudo pode mudar com o novo Governo que sair das eleições de 10 de março. Por isso é que, para Luís Marques Mendes, que encerrou o Observatório do Imobiliário, o que devia haver “era um pacto de habitação entre partidos”.

Que tipo de casa procuram os portugueses?

O estudo “Habitação em Portugal: O Que Mudou nos Últimos Anos” conclui que os portugueses procuram moradias ou apartamentos T3 — usados, mas sem precisarem de obras. Devem ter entre 91 m2 e 150 m2, duas casas de banho, garagem, arrecadação, terraço ou varanda e custar entre €100 mil e €200 mil ou ter uma renda de €500.


€331

mil é o valor médio das casas T3 e T4 com 91 m2 a 150 m2 (as que os portugueses mais procuram), mas ficam nos subúrbios, e as famílias preferem casas no centro. Por isso, acabam por comprar um T2 com 51 m2 a 90 m2, mas com um preço muito semelhante ao da casa dos subúrbios: €325 mil em média. Se for para arrendar, pagam, em média, €821/mês pela casa mais pequena no centro, quando nos subúrbios a renda seria €689


Que tipo de casa compram os portugueses?

Pelo que já foi escrito acima, fica claro que a casa que os portugueses procuram não é a casa que compram. É mais pequena, só tem um casa de banho em vez de duas, nem sempre tem garagem e arrecadação ou acesso a transportes e a qualidade dos materiais é inferior. Além disso, o preço é semelhante ao da casa desejada, que era maior.


73%

é a percentagem de pessoas que, quando procuram casa, querem ficar na mesma cidade onde já vivem. Além disso, 49% querem ficar no centro, o que também faz com que tenham de pagar quase o mesmo do que por uma casa nos subúrbios, mas mais pequena. A principal razão para esta realidade é a falta de uma rede de transportes adequada que chegue às zonas onde estão as casas disponíveis e com melhores preços


Qual o fator que mais leva a desistir de comprar casa?

Uma das principais conclusões do estudo é de que, neste momento, 55% dos portugueses desistem de comprar casa por causa do preço. Não só porque só querem gastar até €200 mil e a maior parte das casas custa mais, mas também porque só podem ter uma taxa de esforço de 33% quando pedem o empréstimo.