O presidente da Redes Energéticas de Portugal (REN) chamou atenção da plateia da conferência "Portugal Moçambique - Ligações Fortes", que decorre em Maputo, ao afirmar que "o facto da exploração do gás e do petróleo iniciarem em 2018 não significa que os ganhos só se devem fazer sentir nesse momento".
Para Rui Cartaxo, Moçambique tem de fazer um caminho diferente, obtendo os benefícios logo após a atribuição de licenças às empresas de prospecção dos recursos naturais.
O envolvimento das pequenas e médias empresas na actividade dos grandes projectos e a formação de recursos humanos nacionais é a forma mais imediata de começar a gerar resultados.
Rui Cartaxo contou a experiência portuguesa na utilização do gás natural. Disse que, antes do país introduzir este combustível, seleccionou e formou centenas de técnicos nacionais, tendo hoje especialistas conhecedores do mercado a todos os níveis.
"Moçambique tem uma oportunidade histórica. No meu entender, a coisa mais importante para dar o salto são as pessoas", explicou, adiantando que não se podem fazer contratos do tipo 'chave na mão', em que o investidor entra com capital e recursos humanos.
Diplomacia energética
O presidente do conselho de administração da Electricidade de Moçambique (EDM) é um homem preocupado. Augusto de Sousa diz que a maior parte dos projectos de médio e grande impacto não articula as necessidades de energia com a companhia, o que sobrecarrega o sistema e prejudica a planificação.
O projecto de construção do edifício-sede do Banco Central é um dos casos caso que "tira o sono'" a Augusto de Sousa. O presidente da EDM diz que o futuro edifício vai consumir oito megawatts de energia eléctrica, a mesma quantidade que a empresa fornece à cidade de Pemba. "Como é possível o Banco de Moçambique avançar com um projecto desta natureza sem consultar se a EDM tem disponibilidade de electricidade ou não?", questionou.
O projecto do edifício-sede do Banco de Moçambique não é um caso isolado. Há vários prédios, incluindo instituições governamentais, erguidos no coração da cidade Maputo, em total desarticulação com a empresa de fornecimento de electricidade.
O presidente da EDM debate-se ainda com outro dilema: as necessidades de energia eléctrica, quer ao nível do consumo doméstico, quer empresarial, estão acima da capacidade da empresa. Ou seja, a velocidade no consumo de energia é superior à implementação de projectos para cobrir a procura.
Augusto de Sousa diz que tem estado a fazer diplomacia energética junto do Governo, comunicação social e agentes económicos sobre a necessidade de criação de uma agenda comum que facilite a coordenação institucional.
Nos últimos dez anos, a EDM investiu 8,5 milhões de dólares na electrificação dos distritos. Nos próximos cinco, serão necessários 500 milhões de dólares para adaptar o sistema, já que as necessidades irão crescer. A solução financeira é complexa, mas Augusto de Sousa está optimista. Diz que há clientes à espera de energia, o que torna os projectos financiáveis.
China e Índia: a solução
Salimo Abdula, presidente do Conselho de Administração da Intelec Holding, diz que a solução financeira para os grandes projectos de energia pode vir da China e da Índia, na medida em que estes países têm capital financeiro e estão interessados em fazer parcerias.
Moçambique tem vários projectos de energia em vista, mas falta dinheiro para a respetiva implementação. Os projectos de construção da barragem de Mpanda N'kwua e do Sistema de Transporte de Electricidade (STE) são os que carecem de elevados investimentos, acima do PIB nacional.
Celso Correia, presidente do grupo Insitec, diz que o caminho está aberto e que a elevada procura regional é em si um factor que garante a viabilidade dos projectos. "Se não tivermos projectos a funcionar, falhamos. Temos que estruturar a solução financeira e há possibilidades, porque somos naturalmente competitivos", disse.
O projecto da barragem de Mpanda N'kuwa não pode avançar sem a construção do STE, considerado a "espinha dorsal" pa a futura distribuição de energia eléctrica ao país. O custo das duas obras ronda os sete mil milhões de dólares. Celso Correia diz que é preciso conjugar as necessidades internas e regionais para fechar o financiamento dos projectos.
Em Moçambique, há projectos industriais para a construção de uma fábrica de cimento e para a exploração de recursos naturais bloqueados por falta de energia. A vizinha África do Sul distribui energia com limitações, por falta de capacidade.
Celso Correia entende, também, que nos próximos 15 anos será necessário "moçambicanizar" a economia nacional, de modo a servir os interesses dos moçambicanos. Todos os projectos, defende, devem submeter-se à agenda nacional de Moçambique.