Geração E

“Temos de começar a falar de política e de partidos nas escolas”

Recém reeleito para um segundo mandato como secretário-geral da União Internacional de Juventudes Socialistas, Bruno Gonçalves defende quotas para jovens nas listas partidárias. Salienta o “capital político” e “prestígio” de António Costa nas instituições europeias, mas admite que a saída do primeiro-ministro não é uma “realidade atual”

Bruno Gonçalves, eurodeputado do PS
José António Rodrigues / Partido Socialista

Basta estar de olho atento para descobrir cada vez mais portugueses entre os cargos internacionais das mais variadas instituições. Neste mês de junho dois portugueses foram reeleitos para cargos de liderança internacional no campo das juventudes partidárias: Lídia Pereira, eurodeputada do PSD, foi reconduzida como presidente da juventude do Partido Popular Europeu e Bruno Gonçalves, de 26 anos, foi eleito, no dia 24, para um segundo mandato como secretário-geral da União Internacional de Juventudes Socialistas (UISY) que agrega jovens de movimentos trabalhistas, socialistas e sociais-democratas de todo o mundo.

Em conversa com o Expresso, a partir da América do Sul, o jovem socialista defende quotas para os jovens nas listas partidárias e apela aos partidos para uma maior aproximação à realidade juvenil. Além de um país profundamente insatisfeito, a sondagem ICS/ISCTE para o Expresso e para a SIC, divulgada no início de junho, mostrou a opinião das pessoas em relação a possíveis reformas políticas. Uma das que colecionou mais apoiantes (cerca de 67% tendencialmente a favor) foi a introdução de quotas para candidatos mais jovens nas listas partidárias.

A liderar um projeto recheado de jovens politicamente ativos, também Bruno Gonçalves não tem dúvidas a cerca desta proposta. “Sobre as quotas de jovens nos partidos, tenho a mesma posição que relativamente às [quotas para] mulheres e a minha resposta é firmemente sim. Foram as quotas que permitiram que hoje existam mais mulheres do que nunca no Parlamento português. Não acredito na tese de que antes as mulheres não estavam interessadas em política, o que acontece é que o sistema patriarcal dá uma forte presença aos homens”, explicou. Assim, também no caso dos mais jovens é preciso garantir-lhes “representação” nos “quadros de decisão” não só para os aproximar da política, como também para garantir “mudanças reformistas”. “Quando os jovens têm acesso a lugares de decisão, eles implementam mudanças reformistas. Se olharmos para os jovens na bancada parlamentar do PS, por exemplo, vemos os avanços que deram em casos como a proposta para o fim das terapias de conversão, que afetam tantos jovens da comunidade LGBT+, ou nas questões do clima”.

PS já deu o “exemplo”, mas é preciso fazer mais

Nesta matéria, Bruno Gonçalves considera que o seu partido tem “dado o exemplo” com a “maior bancada de jovens na AR”, mas é preciso ir mais longe. “O PS tem uma recomendação para inclusão de jovens nas listas de todas as estruturas federativas, liderada pelo primeiro-ministro. O próximo passo é incluir jovens nas listas em lugares elegíveis”. Esta sugestão do secretário-geral da IUSY passa pelo PS começar a incluir esta nova geração de candidatos nos primeiros lugares das listas – por norma, ocupados na sua maioria por membros do Governo – para conseguirem assento parlamentar. Mesmo sem este avanço, o jovem desafia partidos como o PSD e a Iniciativa Liberal a seguirem os passos dos socialistas e a incluírem esta “recomendação” nos seus partidos. “Tendo em mente que o objetivo final não são as quotas pelas quotas, mas as quotas pelos jovens e pela participação dos jovens na política”, resume.

Para lá desta medida, os partidos devem “ir ao encontro dos jovens” para aproximarem as novas gerações da política. “Os jovens estão a estudar ou a trabalhar e os partidos políticos não estão nem nas universidades nem nas empresas. Mais do que um acompanhamento pontual em tempo de eleições, é preciso um acompanhamento permanente [dos partidos]”. Outra das preocupações de Bruno Gonçalves está na “mobilização de jovens nos sindicatos”. “Portugal tem uma das taxas mais baixas de sindicalização de jovens o que é preocupante não só para os direitos laborais, mas também para a participação política dos jovens. Na Suécia, na Noruega ou na Finlândia, os jovens que estão nas estruturas sindicais influenciam a agenda laboral e económica dos partidos e não o contrário”. Para isso, seria necessária uma “mudança de paradigma” que, entre outros fatores, deveria incluir uma reforma no sistema educativo. “Nas escolas temos de começar a falar de política, de partidos e do funcionamento das instituições democráticas”.

Bruno Gonçalves, secretário-geral da IUSY, no programa ‘Politica Com Palavra’ do PS
José António Rodrigues / Partido Socialista

Costa tem “capital político”

fala da “credibilidade” de António Costa entre os órgãos europeus e mundiais, mas defende que uma saída dependeria de uma “vontade” que não existe. “O próprio [António Costa] já disse inequivocamente que essa não é uma realidade atual. O seu compromisso é para com os portugueses”, disse ao Expresso. Quanto à paragem do primeiro-ministro na Hungria para ver o jogo da Liga Europa, Bruno Gonçalves devolve as críticas de “hipocrisia” à oposição. “A hipocrisia é do Partido Popular Europeu [família política europeia do PSD] que demorou anos para perceber que Viktor Orbán é um populista de extrema-direita".

“O primeiro-ministro é uma pessoa reconhecida, falada e visível não só do ponto de vista europeu, mas mundial. É uma pessoa capaz de criar diálogo e que venceu um conjunto sucessivo de eleições que mais nenhum líder da Europa democrática conseguiu nos últimos 10 anos”, começa por defender Bruno Gonçalves. Esta “credibilidade” poderia ser uma mais-valia para a presidência do Conselho Europeu, o cargo para o qual o nome de António Costa tem sido apontado – mas, que o próprio veio afastar em nome da “estabilidade”. Mas acrescenta: “Com a presidência de Charles Michel, desde a invasão da Rússia a Ucrânia, temos visto uma falta de sintonia e de entendimento do papel das instituições. Tanto que a presidente da Comissão Europeia [Ursula von der Leyen] tem assumido um papel de protagonismo relativamente ao Presidente do Conselho Europeu. Se há alguma coisa que sabemos de António Costa é que não é uma figura secundária. Desse prisma, o primeiro-ministro seria sempre um nome a ter em conta para devolver a importância política ao Conselho Europeu”.

Contudo, o novo secretário-geral da IUSY separa a “possibilidade” de António Costa trocar as suas atuais funções por Bruxelas, depois das eleições europeias de 2024, da “vontade” do primeiro-ministro. “O próprio [António Costa] já disse inequivocamente que essa não é uma realidade atual. O seu compromisso é para com os portugueses”, disse tendo como referência a resposta de António Costa ao Jornal Público onde diz ser o “garante de estabilidade”. Para Bruno Gonçalves, esta “azáfama” criada num contexto em que “nem sequer temos eleições do Conselho Europeu para breve” apenas “interessa” à oposição. “A quem é que interessa que se fale que António Costa vá para uma instituição europeia a cada dois ou três meses? Naturalmente à oposição que continua sem conseguir constituir uma alternativa validada nas urnas”.

Ainda antes da possível ida de António Costa para Bruxelas, estalou uma nova polémica no centro do Governo com a paragem, fora da agenda oficial, do primeiro-ministro na Hungria para ver o jogo da Liga Europa. Na breve passagem pelo parlamento, na quinta-feira passada, António Costa fintou as perguntas e foi acusado pela oposição de “hipocrisia” por atacar a extrema-direita em Portugal e sentar-se ao lado de Viktor Orbán na Hungria. Em resposta, Bruno Gonçalves devolve as acusações: “a hipocrisia é do Partido Popular Europeu que demorou anos a querer perceber que Viktor Orbán é um populista de extrema-direita". À semelhança de António Costa no debate de antecipação sobre o Conselho Europeu, também o secretário-geral da IUSY preferiu defender a posição socialista com o “conjunto de recomendações ao Conselho Europeu sobre sanções à Hungria” a que o PS deu luz verde. “O PS, António Costa e todos os líderes do progressismo em Portugal tem uma consciência muito tranquila porque sabem separar águas entre aquilo que são temas de Estado e aquilo que são posições ideológicas e democráticas”.