Exclusivo

Exclusivos

Jorge Sampaio (1939-2021). Um líder sem medo de chorar em público

Tinha a audácia rara dos tímidos que não escondem emoções. Com os olhos (por vezes) marejados de lágrimas, o jovem Jorge Sampaio enfrentou a ditadura e conquistou a confiança da sua geração. As lágrimas ajudaram muitos a acreditar "na sua generosidade", conta Maria Emília Brederode dos Santos que respirou intensamente o ambiente de "subterrâneos da liberdade" que se vivia na Associação Académica de Direito. A autenticidade e o talento para construir pontes marcariam a vida e os 'voos' que guiaram Sampaio do Tribunal Plenário às Eleições de 1969, do MES ao PS, da Câmara de Lisboa à Presidência da República, e do trabalho nas Nações Unidas como enviado do secretário-geral para a Luta contra a Tuberculose à presidência da Aliança das Civilizações. Esta é a história de um homem discreto que tinha um enorme sentido de humor. De um homem a quem a saúde faltou algumas vezes mas que mesmo assim quis estar presente na luta pelo direito à educação dos estudantes (refugiados) sírios e afegãos

Jorge Sampaio no exterior da Casa do Regalo (Tapada das Necessidades) onde funcionou o seu Gabinete
Gonçalo Rosa da Silva

Sara Bensliman Bensaúde teve um papel importante na vida dos netos que passaram grandes temporadas em casa da avó materna. Jorge, ainda não tinha completado 15 meses quando o marido de Sara (seu avô materno) faleceu, oito anos depois de ser ministro dos Negócios Estrangeiros da Ditadura Nacional entre 1930 e 1932. Nesse período, foram várias as vezes em que Fernando Branco representou Portugal nas assembleias da Sociedade das Nações (espécie de 'mãe' das Nações Unidas) que se realizavam em Genebra.

O pequeno Jorge não deve ter conservado memórias de andar ao colo do avô, mas nunca esqueceu a incrível viagem que fez quando tinha oito anos, e a carreira clínica do pai o fez subir com ar seguro e confiante as escadas de um avião da Pan Am que o haveriam de fazer voar até aos Estados Unidos. Em 1947, as viagens de avião eram raras, e os portugueses que voavam ainda menos.

A pose afável mas determinada com que a criança acena para quem em terra a vê partir - como mostra a imagem publicada na capa da Revista do Expresso de 20 de janeiro de 1996 - é uma alegoria do que viria a ser vida deste homem que desde cedo se bateu por ideais e pela construção de um mundo mais fraterno e menos desigual.