Sistema financeiro

Centeno admite que garantia para compra de casa pelos jovens pode arriscar “estabilidade” e causar “perturbação”

Governador acredita que os “benefícios de curto prazo” da medida para apoiar crédito à habitação podem ser ofuscados. Crescimento de incumprimentos nos empréstimos é uma das preocupações

TIAGO MIRANDA

Mário Centeno admitiu, no Parlamento, que o desenho de uma garantia pública para facilitar o crédito à habitação para os jovens até aos 35 anos arrisca colocar em causa a estabilidade conseguida no mercado, nomeadamente no que diz respeito aos incumprimentos.

Em audição na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública esta quarta-feira, 19 de junho, o governador do Banco de Portugal voltou a levantar dúvidas sobre essa medida proposta pelo Governo de Luís Montenegro. O diploma governamental, a ser trabalhado em conjunto com o supervisor e com o sector bancário, ainda não é conhecido, está a ser trabalhado, mas Centeno quis ressalvar “uma preocupação” “sobre a dimensão macroprudencial”.

Uma das dúvidas diz respeito à comparação entre o valor dos empréstimos à habitação e o valor do imóvel adquirido (atualmente com um limite de 90%), mas que a garantia pública pretende fazer com que possa ser de 100% (financiamento de todo o imóvel) para os jovens elegíveis.

“A existência de um rácio entre valor do empréstimo e o valor da propriedade, o LTV [loan-to-value], não pode ser interpretada como uma questão apenas do lado dos bancos, mas também do lado dos mutuários, porque o risco está associado a todas as dimensões”, declarou Centeno. Ou seja, é preciso ter em conta que o cliente estar-se-á a financiar em 100%, e que isso terá implicações diferentes do que quando um cliente só se financia até 90%.

Além disso, o governador mencionou o “rácio de serviço das dívidas nos rendimentos”, ou seja, o peso das prestações nos rendimentos do mutuário. E esse peso, se for demasiado alto, pode pôr o mercado em risco. “Temos níveis de incumprimento muito baixos, e não podemos pôr em causa esta estabilidade”, alertou.

O aviso do governador aos deputados - e aos clientes bancários - não se ficou por aqui: “A perturbação que tudo faz aos mercados é muito maior do que o benefício de curto prazo que podemos ter”.

São avisos deixados pelo governador sobre um diploma ainda a ser trabalhado e que o Expresso já deu conta que só avançará com apoio entre Governo e Banco de Portugal, sob pena de não ser exequível para os bancos na hora de concederem o crédito. Foram avisos proferidos neste dia 19 de junho, quando o Governo de Montenegro queria que estivesse em vigor em agosto deste ano.