Sistema financeiro

Centeno indica que juros dos depósitos vão continuar a subir, mas Euribor pode começar a recuar no final do ano

Há margem para a Euribor começar a cair no fim do ano depois de um ciclo de subidas ainda em curso, disse o governador do Banco de Portugal em entrevista à RTP. Entretanto, os juros dos depósitos também vão continuar a trajetória de subida nos próximos tempos: “há margem” para isso, assegura Mário Centeno

Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno. Foto Ana Baião
Ana Baiao

O governador do Banco de Portugal (BdP), Mário Centeno, disse na quarta-feira, 28 de junho, que as Euribor [taxas de juro de referência no crédito à habitação, mas que também funcionam como indexantes em alguns depósitos a prazo] vão continuar a subir até setembro (12 meses) e novembro (3 e 6 meses), antecipando que a partir destas datas comecem a cair lentamente.

"Esta trajetória vai continuar em alta", referiu o governador do BdP no programa Grande Entrevista, na RTP3, precisando que a Euribor a 12 meses vai "continuar a subir até setembro deste ano" e a Euribor a 3 e 6 meses até novembro.

Algum alívio com as prestações do crédito à habitação fica, assim, adiado para o final do ano, com Mário Centeno a referir que "os futuros indicam que a partir destas datas, setembro para 12 meses e novembro para 3 e 6 meses, as taxas vão começar a cair, lestamente".

“Há margem” para aumento dos juros dos depósitos

O governador mostrou-se convicto de "que as taxas de juros dos depósitos vão continuar a subir nos próximos tempos", havendo "margem para isso acontecer e deve acontecer".

Mário Centeno recusou, contudo, a tese de que os bancos portugueses estão a ser muito lentos a subir a taxa de juro que oferecem pelos depósitos, referindo que a remuneração dos juros dos depósitos já aumentou 91%.

O supervisor do sistema bancário referiu ainda, a propósito das comparações com outros países europeus sobre as taxas de juro dos depósitos, que quando as taxas de juro estiveram negativas para os créditos, em Portugal as dos depósitos nunca foram negativas, ao contrário do que sucedeu noutros países europeus.

Essa situação, disse, fez com que os bancos portugueses tivessem registado, durante a era dos juros negativos, as margens financeiras mais baixas - o que se deveu ao facto de por cá a maioria dos créditos estar indexado a taxa variável.

Durante a entrevista, Mário Centeno disse ainda que o processo de apoios à banca visou sempre e teve sempre por objetivo principal proteger as poupanças dos cidadãos e a confiança no sistema financeiro.

Emprego qualificado cresce

Na entrevista que decorreu no Museu do Dinheiro do Banco de Portugal (BdP), em Lisboa, Centeno considerou ser um "mito" a ideia de que a economia portuguesa não cria empregos qualificados e com salários acima da média.

"Desde 2019 criámos 112 mil postos de trabalho em setores como comunicação, consultoria, setores científicos, imobiliário", disse, precisando que o salário médio destes novos empregos ronda os 1800 euros.

Referindo que apesar de o turismo ser sempre apresentado como o grande motor da economia, os dados mostram que o emprego cresceu 35% naqueles setores (com o seu peso a passar de 10% para valores da ordem dos 14% a 15%), enquanto no mesmo período, ou seja, desde 2019, o turismo criou 44 mil postos de trabalho.

"Não é verdade que desde 2019 o emprego tenha crescido à custa de setores de salários baixos e à custa apenas do turismo", precisou, salientando que a economia portuguesa atravessa uma lógica de "transição", mas que este é um processo lento, que não consegue de repente responder às aspirações de todos os jovens qualificados.

Durante a entrevista, Mário Centeno refutou ainda um outro mito, muitas vezes com eco fora de portas, relacionado com os créditos contraídos pelas famílias.

"Aquilo de se dizer que os portugueses viviam acima das suas possibilidades e que os portugueses não cumprem é falso. Não cola com a realidade. Os portugueses cumprem", disse, sublinhando que as taxas de incumprimento "são muito baixas e neste momento não há nenhuma alteração face a esta realidade".

Questionado sobre o facto de numa zona euro quase estagnada, Portugal se destacar pelo ritmo do crescimento da sua economia, Mário Centeno afirmou que a economia atravessa uma dinâmica que é nova, em que o número de empregos aumentou em um milhão no espaço de uma década e em que pela primeira vez os imigrantes que chegam ao país têm menos qualificações do que quem já cá reside.

Sobre se a folga orçamental deve ser usada para reduzir impostos e aumentar salários, referiu que a redução dos tributos deve também ser vista numa lógica de transição.

Sobre a vertente salarial, lembrou que os salários têm vindo a crescer e que do ponto de vista da decisão política não devem ser tomadas decisões que ponham em causa o curso do ciclo económico.

A prioridade deve ir para a redução da dívida, referiu, lembrando que apesar da forte redução desta em percentagem do PIB, "continua alta", sendo aconselhável "manter a trajetória de redução sustentada".