O Parlamento aprovou esta sexta-feira a criação de uma comissão eventual de acompanhamento da execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e do Programa Portugal 2030 (PT2030). A proposta, apresentada pelo PSD, passou com os votos a favor dos partidos Chega, Iniciativa Liberal (IL), CDS-PP e PAN, e contra do Bloco de Esquerda (BE), PS, PCP e Livre.
No projeto que submeteu à Assembleia da República, a 24 de abril, o grupo parlamentar liderado por Hugo Soares justifica a constituição desta comissão parlamentar com a necessidade de “garantir mais transparência, mais fiscalização e um melhor desempenho ao nível da execução” dos fundos europeus. O documento diz ainda que a mesma deverá encetar “mecanismos formais para a realização de audições” sempre que entender conveniente.
De recordar que esta semana a Comissão Europeia deixou um alerta ao País, sugerindo que “novos esforços são essenciais para uma implementação bem-sucedida de todas as medidas do PRR até agosto de 2026”. Bruxelas põe em causa, aliás, a capacidade de alguns projetos de maior dimensão serem terminados dentro do prazo-limite, nomeadamente os de infraestrutura calendarizados para o fim do período.
Ora, o que nos diz o último relatório de monitorização do PRR é que, até 12 de junho, Portugal tinha executado, isto é, pago aos beneficiários diretos e finais, 4525 milhões de euros - o correspondente a 20% da dotação do programa (22.216 milhões). O desempenho é ainda mais baixo quando se olha para o boletim do PT2030: de um pacote de 22.995 milhões de euros, apenas 589 milhões (2,5%) chegaram aos candidatos.
É nesse sentido que o PSD considera de “extrema importância corresponder e contrariar a atual situação de atraso na execução, bem como acompanhar a mesma numa perspetiva de melhoria estratégica na aplicação desses mecanismos”. Durante a sessão plenária de quinta-feira, a deputada social-democrata Dulcineia Moura afiançou que “só através de uma comissão independente será possível acautelar a autonomia necessária que o assunto merece”.
Esquerda acusa PSD de querer obstruir o escrutínio e ter "mais cargos para distribuir"
A esquerda não tardou em questionar a iniciativa parlamentar do PSD, lembrando que é da competência da já existente 13.ª comissão de Coesão Territorial e Poder Local o acompanhamento destas matérias.
Enquanto Paulo Muacho, do Livre, disse não compreender a utilidade da nova comissão senão “criar entropia no Parlamento, multiplicar reuniões e impossibilitar a oposição de fazer o devido escrutínio”, Joana Mortágua, do BE, levantou suspeitas em relação ao PSD querer “esvaziar” as atuais comissões ou até eventualmente ter “mais cargos para distribuir". “Redundante” e “desaconselhável” foram as palavras escolhidas por Alfredo Maia, do PCP, para descrever a proposta.
Também a deputada única do PAN, Inês de Sousa Real, acusou o Governo de afastar da fiscalização dos fundos outros intervenientes, como o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), “abrindo assim a porta a uma má execução”, frisando: “Não podemos retirar competências a entidades já existentes para criar uma comissão que não se substitui às mesmas." Já do lado do PS, Jorge Botelho asseverou que não há nenhum propósito neste projeto que não pudesse ser assegurado pela 13.ª comissão.
Dulcineia Moura clarificou que aquele grupo “prosseguirá com os seus trabalhos, assumindo o acompanhamento de temas tão importantes para o país como, por exemplo, a coesão territorial e social, o ordenamento do território, a descentralização, o desenvolvimento regional e a valorização do interior, as autarquias locais, a transição digital, sem ter necessariamente desvincular esses assuntos dos fundos europeus”.
O sim da direita: maior pacote financeiro exige "comissão especializada"
Posicionando-se do lado do PSD, Bruno Pinto, do Chega, garantiu que não haverá, “de forma nenhuma”, um esvaziamento de funções da comissão de Coesão Territorial e Poder Local - isto após o deputado Eduardo Teixeira, do mesmo partido, ter confirmado a viabilização da comissão. Na mesma linha, a IL, representada por Carlos Guimarães Pinto, concordou com a iniciativa, dizendo que os liberais não iriam alinhar no “discurso populista de que se vai criar mais cargos" - até porque, "tanto quanto se sabe, nem sequer são pagos”.
Como seria de esperar, João Pinho de Almeida, afirmou que, da parte do CDS-PP, não veem "que não faça sentido ter uma comissão especializada para esta matéria": "Neste momento, temos o maior pacote financeiro de sempre de apoios europeus, faz sentido, por isso, que lhe demos a importância que tem. O facto de termos o PRR em execução em simultâneo com o PT2030, torna esta circunstância eventual e extraordinária”, notou.
Com "luz verde" do Chega, IL, CDS-PP e PAN, a proposta do PSD avança assim com o “objetivo garantir a transparência ao nível da informação partilhada, criar uma boa e rigorosa análise da execução, monitorização e fiscalização dos dois programas, assim como envolver todos os partidos com assento parlamentar” até ao final da presente legislatura. E, segundo a deputada dos sociais-democratas, com “metas e prazos específicos a cumprir”.