A decisão de cortar os juros na reunião de quinta-feira do Banco Central Europeu (BCE) teve um dissidente, revelou Christine Lagarde na conferência de imprensa que se seguiu à divulgação do corte de 25 pontos-base nas taxas diretoras. A presidente do BCE não identificou nem o sentido do voto nem o dissidente, mas ironizou que, em breve, se saberia quem foi. Um dia depois, o mistério foi desvendado.
A Bloomberg adiantou que um porta-voz de Robert Holzmann, o governador do banco central da Áustria, confirmou que o banqueiro considerado o ‘super-falcão’ do euro, votou contra a descida dos juros por considerar que “se as decisões são guiadas pelos dados económicos, então devem ser mesmo guiadas por esses dados”.
Ora, a inflação acelerou em maio, subindo de 2,4% para 2,6%, e as projeções dos economistas do BCE reviram em alta a inflação média anual em 2024 e 2025, em relação ao quadro de previsões avançado anteriormente na reunião de março. O BCE revê as previsões trimestralmente para as reuniões de março, junho, setembro e dezembro.
As previsões publicadas esta quinta-feira apontam para uma inflação média anual de 2,5% em 2024 - acima dos 2,3% previstos em março - e de 2,2% no próximo ano.
Para Holzmann, a trajetória da inflação ainda não aconselharia a decisão de avançar para um primeiro corte de juros, depois de um ciclo de aperto monetário que durou desde julho de 2022.
Após a revelação por Lagarde de um voto dissidente que manchou a unanimidade, o site Econostream admitiu que o voto contra poderia ter sido de um governador que pretendesse um corte mais robusto. O site recordou que Mário Centeno, o governador do Banco de Portugal, considerado uma ‘pomba’, havia admitido em entrevista que um primeiro corte de 50 pontos-base (meio ponto percentual) poderia ser adequado como decisão à cabeça num ciclo de descida dos juros e moderação da política restritiva do BCE.
Na gíria dos bancos centrais, ‘falcão’ é atribuído aos banqueiros centrais que defendem, em geral, uma política de austeridade monetária, e ‘pomba’ aos que são a favor de mais alívio monetário para não prejudicar a economia real. Atualmente, segundo a contabilidade do portal In Touch Capital Markets há atualmente nove ‘pombas’ e 17 ‘falcões’ no conselho formado por 26 membros (seis membros da comissão executiva mais 20 presidentes ou governadores dos 20 bancos centrais integrados no euro).
As probabilidades de se repetir um corte de juros na próxima reunião de 18 de julho são inferiores a 15%. No mercado de futuros, projeta-se um segundo corte para a reunião de 12 de setembro, com uma probabilidade de 61%.
O portal MacroMicro avança a expetativa de que a taxa de remuneração dos depósitos dos bancos comerciais no BCE desça de 3,75% - depois do corte decidido na quinta-feira - para 3,3% no final de dezembro. Estas expetativas acomodam, para este ano, mais uma descida de juros e deixam em aberto um terceiro corte.