Economia

Recibos verdes, empresas, abonos: Segurança Social tem 85 medidas para facilitar a vida a cidadãos e empresas, mas não são para já

Equipa da Segurança Social apresentou medidas de simplificação até 2026 - e explicou como "com cliques, poucos cliques, se constroem futuros". Citou-se Torga e "derrubaram-se muros, ameias, capelinhas”

JOSÉ FERNANDES

“Se nasceu uma criança [e o Estado tem dados sobre os nascimentos] porque é que o abono de família não é atribuído de forma automática?”. Se os trabalhadores independentes já são obrigados a emitir recibos e a comunicá-los mensalmente ao Fisco, porque é que ainda têm de repetir a comunicação trimestralmente à Segurança Social? Porque é que as empresas têm de enviar, todos os meses, uma declaração mensal de remunerações ao Fisco e outra à Segurança Social?

As perguntas, que muitos cidadãos se colocam há anos, foram repetidas esta segunda-feira ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, mas ficaram sem resposta. O que Ana Mendes Godinho garante é que, com uma injeção de 200 milhões de euros do PRR, entre 2022 e 2026, estas questões são para serem resolvidas. Como? Com uma “mudança completa do paradigma da Segurança Social”.

O Governo escolheu o museu da eletricidade, em Lisboa, para apresentar esta segunda-feira 85 medidas de simplificação da interação com a Segurança Social que, se forem implementadas, porão fim a muitos quebras cabeças e trabalhos redobrados que há anos sobrecarregam cidadãos e empresas. O programa é financiado com 200 milhões de euros do PRR e, apesar de muitos dos problemas estarem identificados há anos, não há transformações imediatas: são para implementar algures entre este ano e 2026, ainda sem calendarização precisa.

Ao abrigo do “programa de transformação digital”, deixará, por exemplo, de ser necessário requerer o abono de família – porque a Segurança Social vai cruzar a informação que tem das famílias com os dados sobre rendimentos da Autoridade Tributária. Os "recibos verdes" que, desde 2019 contam com um novo regime declarativo, deixarão de ser obrigados de comunicar informação trimestral à Segurança Social, evitando a duplicação com o Fisco. E as empresas também ficarão desoneradas de duplicar dados para ambas as entidades (embora só parcialmente).

Algumas das medidas passam, sobretudo, por eliminar redundâncias há muito desnecessárias e que não avançaram, em parte, porque a gestão financeira da Segurança Social é separada da do Fisco, e nem sempre trabalham de forma articulada. Outros projetos, mais trabalhosos, passam por criar um simulador que permita aos cidadãos perceber quais as prestações sociais a que têm direito – e, se tudo correr como o desejado, a terem direito a elas automaticamente, sem necessidade de pedido.

“Deitar abaixo muros, ameias, capelinhas”

As linhas gerais do plano foram apresentadas pela atriz, locutora e apresentadora Cláudia Semedo que, em vários momentos da sessão, se mostrou encantada com a simplificação administrativa e as facilidades que estão a ser planeadas.

Classificou o pequeno filme preparado pelo Governo de “inspirador, que nos transporta para o futuro”, e considerou “muito bom sentir o vosso entusiasmo e a vossa energia”.

E, para Ana Mendes Godinho, não era para menos. Segundo a ministra, esta segunda-feira, dia em que a sua equipa apresentou os traços gerais do plano, “é um dia de agradecimento, de orgulho, e de reinvenção”.

De agradecimento a todos os que participaram num “projeto coletivo” , que “procura ligar o Estado e as empresas, deitando abaixo muros, ameias, capelinhas para nos servir melhor nesta missão coletiva”. De orgulho, porque, a par da transformação, a “Segurança Social continua a sua atividade no sentido de nunca deixar cair o seu core de responder às pessoas quando precisam (as prestações sociais aumentaram 28%). E um dia de “reinvenção”, porque a Segurança Social passa a estar “completamente focada em responder de forma mais personalizada às pessoas e empresas, mais rápida, descomplicada e próxima”. Trata-se, segundo a ministra, de “fazer taylorismo em função das necessidades reais”.

Gabriel Bastos, secretário de Estado da Segurança Social, por seu turno, garantiu que as 85 medidas “contribuirão para uma Segurança Social mais “humana, próxima, eficiente e robusta”. Considera que o plano é ambicioso “claro que sim, mas essa é a única forma de projetarmos o futuro”; e tem como inspiração o poema Sísifo de Miguel Torga - “enquanto não alcances não descanses, de nenhum fruto queiras só a metade”.

A apresentadora ficou, uma vez mais, bem impressionada. “Terminar com Torga é sempre incrível”, comentou.