Onze bancos a operar em Portugal estão a ser julgados em Santarém por trocarem informações sobre créditos entre si, que deveriam manter para si. Contestam as coimas globais que ascendem a cerca de 225 milhões de euros que foram aplicadas pela Autoridade da Concorrência em 2019. Nas alegações finais do julgamento, que arrancaram na semana que passou em Santarém, continuando na que agora se inicia, o Ministério Público apontou para uma redução destas coimas, ainda que não extensível a todos os bancos. Já a AdC pretende que haja um agravamento para os maiores bancos.
A Caixa Geral de Depósitos sofreu a maior coima do processo de contraordenação da autoridade comandada por Margarida Matos Rosa, de 82 milhões de euros, sendo que a AdC até a quer agravar devido à postura do banco público em tribunal, que considera negativa. O Ministério Público aponta aqui para a sua manutenção. O mesmo acontece para o Santander Totta, com uma sanção de 35,65 milhões de euros.
Já nos casos do Banco Comercial Português e do Banco Montepio, o procurador do Ministério Público quer uma redução das sanções aplicadas inicialmente pela AdC (60 milhões e 26 milhões – reduzida a metade devido ao programa de clemência –, respetivamente), ao que, nas alegações finais, a autoridade administrativa se opôs frontalmente, querendo uma subida das coimas.
A decisão final do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão será tomada em abril, mês para o qual se espera a sentença da juíza Mariana Machado. Depois, há ainda possibilidade de recurso.
Coimas
- Caixa Geral de Depósitos
Coima inicial da AdC: 82 milhões
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: 82 milhões
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: Mais de 82 milhões de euros
O procurador Paulo Vieira, que acompanha o julgamento, considera que a coima, sendo elevada, representa apenas 7 milhões de euros por cada ano de infração, inferior aos benefícios que terão sido obtidos com a troca de informação. “Afigura-se que esta coima é de manter nos precisos termos” da condenação da AdC. Paulo Vieira criticou a forma como a CGD, apesar de ser um banco de capitais integralmente públicos, tratou do caso: “efetivamente, tem tratado todo este assunto de forma ligeira”.
Precisamente pela forma como tratou o caso no julgamento, a AdC solicitou um agravamento da coima ao banco presidido por Paulo Macedo. Falta de arrependimento e o tratamento, de “forma ligeira”, do caso, são as razões para o pedido de Ana Nogueira, mandatária da entidade.
- Banco Comercial Português
Coima inicial da AdC: 60 milhões
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: Deve descer se resultados de 2021 prejudicarem capital
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: Mais de 60 milhões
A coima mostra-se “adequada”, mas o MP não tem certezas, porque depende dos resultados de 2021, a divulgar a 28 de fevereiro. “Caso a solidez do banco venha a ficar afetada, se for o caso, entende-se que a coima deverá ser reduzida”, disse Paulo Vieira. Os resultados na Polónia têm apontado para uma quebra dos lucros do banco, devido à herança dos créditos hipotecários em francos suíços.
A falta de arrependimento e de censura sobre os factos levam a AdC a pedir ao tribunal que pondere a subida da sanção ao BCP. Além disso, a autoridade discorda da possibilidade de redução de coima por conta da situação financeira das entidades bancárias.
- Santander Totta (incluindo Popular)
Coima inicial da AdC: 35,65 milhões
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: 35,65 milhões
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: Mais de 35,65 milhões
“As coimas calculadas mostram-se adequadas, sendo de manter integralmente, atendendo aos resultados de 2021, teve lucros muito expressivos”, justificou o procurador.
A AdC discorda. Tal como com a CGD, a postura para com o tribunal foi criticada, por falta de colaboração (que a defesa contestou). Além disso, também não há arrependimento. Assim, foi solicitada a aplicação de uma sanção de maior dimensão.
- Banco BPI
Coima inicial da AdC: 30 milhões
Coima pedida pelo MP pela AdC nas alegações finais: Abaixo de 30 milhões
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 30 milhões
“Entende-se que a coima mostra-se adequada, mas, atendendo à correta postura, e à assunção da responsabilidade através do seu presidente da administração, sufraga-se uma redução marginal da coima”, apontou o representante do Ministério Público.
A AdC mantém a sua posição inicial.
- Banco Montepio
Coima da AdC: 26 milhões, dispensada em metade do valor pelo programa de clemência
Coima pedida pelo MP: Máximo de 4,4 milhões, dispensada em metade do valor pelo programa
O banco aderiu ao programa de clemência da AdC (a segunda adesão, a seguir ao Barclays, pelo que teria direito a dispensa de até 50% da coima). O procurador criticou, porém, a postura do banco, por na fase de julgamento ter uma posição que não é consentânea, e com “atos contrários”, com a clemência. Apesar disso, é de considerar na decisão, defendeu Paulo Vieira, essa adesão. Em relação à sanção, o procurador lembrou a “natureza social” do Montepio, bem como a sua “situação económica frágil” e o facto de o capital ser dos aforradores (os 600 mil associados da mutualista). “Afigura-se, face às necessidades de robustez, que a coima deverá ser substancialmente reduzida, para impedir qualquer tipo de situação. Afigura-se que no seu máximo global não deverá exceder 4,4 milhões, dispensa em metade (2,2 milhões)”, disse ainda o procurador, acrescentando que o Ministério Público “não se oporá a que a coima seja paga em prestações, 100 mil euros cada uma”.
A AdC rejeita a ideia de que possa haver um alívio da coima devido à situação financeira dos visados (“seria chegar à conclusão que o crime compensa, sobretudo no sector bancário”, defendeu Ana Nogueira, diretora da AdC). No caso do Banco Montepio, há a agravar uma “estratégia processual censurável” por ter participado na clemência – que configura a colaboração num ilícito que reconhece -, mas no julgamento não reconhecer infrações.
- BBVA
Coima inicial da AdC: 2,5 milhões
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: 2,5 milhões
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 2,5 milhões
“A coima mostra-se adequada, sendo de a manter integralmente”, até porque teve “lucros realmente extraordinários”, explicou o responsável do MP.
A AdC mantém a sua posição inicial.
- BES
Coima inicial da AdC: 700 mil euros
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: Simbólica
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 700 mil euros
Não há quaisquer razões de prevenção que justifiquem uma coima elevada, por isso, o Ministério Público pede uma coima de “valor meramente simbólico”.
A AdC mantém a sua posição inicial.
- BIC
Coima inicial da AdC: 500 mil euros
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: Abaixo de 500 mil euros
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 500 mil euros
O procurador considera que deverá haver uma “redução marginal da coima”, elogiando o trabalho feito pela defesa. Porém, recusa que não haja coima por as infrações terem sido cometidas pelo BPN, entretanto comprado pelo BIC, pelo simples facto de o NIF do BPN ter sido o assumido pelo BIC.
A AdC mantém a sua posição inicial.
- Crédito Agrícola
Coima inicial da AdC: 350 mil euros
Coima pedida nas alegações finais pelo MP: 350 mil euros, podendo baixar se estiver em má situação financeira
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 350 mil euros
Também se mostra adequada para o MP, ainda que o procurador ressalve que ainda não saíram os resultados de 2021.
A AdC mantém a sua posição inicial
- UCI
Coima da AdC: 150 mil euros
Coima pedida nas alegações finais pelo MP: abaixo de 150 mil euros
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 150 mil euros
É de baixar a coima aplicada à UCI, a mais baixa deste grupo de bancos, segundo o procurador.
A AdC mantém a sua posição inicial.
- Barclays
Coima inicial da AdC: 8 milhões (dispensa na totalidade por programa de clemência)
Coima pedida pelo MP nas alegações finais: menos de 500 mil euros (dispensa na totalidade por programa de clemência)
Coima pedida pela AdC nas alegações finais: 8 milhões (dispensa na totalidade por programa de clemência)
Foi o Barclays que deu origem ao processo, ao denunciar a existência de troca de informações, no fim de 2012. A coima da AdC, pelas suas infrações, era de 8 milhões, mas com dispensa total, por conta desse programa de clemência. O procurador diz que o cálculo deveria apontar as coimas para os 500 mil euros, mas, atendendo à “conduta”, até esses 500 mil euros devem ser reduzidos. Seja como for, esse valor não terá de ser pago devido à clemência.
A AdC mantém a sua posição inicial.