Economia

G7 aprovou imposto mínimo de 15% para as multinacionais. E agora?

O acordo das maiores economias do mundo para assegurar uma maior tributação das grandes empresas deverá permitir uma melhor distribuição de riqueza. Mas, como já comentou o economista Paul Krugman, “muito ainda tem de ser feito para que se torne realidade”

Dado Ruvic/REUTERS

“Comprometemo-nos com uma taxa mínima global de pelo menos 15% numa base país a país”. A frase consta do ponto 16 do comunicado emitido este sábado pelo G7 e promete revolucionar a forma como as empresas multinacionais são tributadas. O acordo das maiores economias do mundo está aí, mas, como em qualquer mudança das regras do jogo, o diabo está nos detalhes. E esses ainda estão por conhecer. O que acontecerá em jurisdições amigas da baixa tributação, como a Irlanda? Qual a reação das grandes empresas tecnológicas? Quanto tempo levará a colocar em prática?

Apesar da afirmação clara de um compromisso para a aplicação de uma taxa de pelo menos 15% sobre os lucros das grandes multinacionais, a posição do G7 surge ainda com poucos detalhes sobre a sua concretização. Isso mesmo sublinhou o economista Paul Krugman, que, num comentário no Twitter, notou a importância da decisão mas lembrou que “muito tem de ser feito até que se torne realidade”.

O Prémio Nobel da Economia assinalou que “a evasão fiscal das empresas provoca grandes perdas de receita e distorce a nossa visão da economia global”. Krugman sublinhou, ainda, a mudança de 180 graus do atual Governo dos Estados Unidos da América face à administração Trump, que defendia um corte de impostos sobre as empresas “na esperança de que elas não colocassem tudo em paraísos fiscais”.

A posição agora anunciada pelo G7 visa dar resposta aos desafios fiscais associados à globalização e à digitalização da economia. Na prática, é a reação das sete maiores economias globais à pressão para combater as estratégias de algumas grandes companhias de usar determinadas jurisdições com baixas taxas de IRC para aí instalar as suas sedes. Ou até de usar uma triangulação entre as suas sedes globais, sociedades instrumentais em paraísos fiscais e subsidiárias regionais noutros países de baixa tributação.

Ainda esta semana, o jornal britânico “The Guardian” revelou que em 2020 a Microsoft registou numa subsidiária irlandesa um lucro de 315 mil milhões de dólares sobre o qual pagou 0% de IRC, uma vez que essa empresa, que não tem trabalhadores, é integralmente detida por uma sociedade nas Bermudas, onde não é cobrado IRC. Da Irlanda saíram para a casa-mãe, a norte-americana Microsoft Corporation, dividendos de 54,5 mil milhões de dólares no ano passado.

É este tipo de estruturas que os líderes governamentais globais querem combater. O comunicado deste sábado do G7 aponta a necessidade de encontrar “uma solução equitativa para a alocação de direitos de tributação”.

A ideia passa por assegurar aos países onde uma determinada empresa de facto vende os seus produtos ou serviços o direito a cobrar impostos sobre pelo menos 20% do lucro que uma determinada multinacional realize nesse país. Mas o direito à tributação não incidirá sobre todo o lucro, apenas sobre o que exceda uma margem de 10%.

O comunicado não vai muito mais longe. A execução prática de uma tributação mínima de 15% dependerá agora da coordenação entre os diversos países onde as grandes multinacionais operam. Mas falta ainda saber se estas novas regras se aplicarão a quaisquer empresas independentemente da dimensão ou da área de atividade. Ou se haverá regimes de excepção.

O professor universitário António Nogueira Leite também reagiu este sábado no Twitter. “Sobre a decisão do G7 relativa à tributação do lucro das empresas, ainda há muitas barreiras a ultrapassar”, escreveu Nogueira Leite, lembrando que os membros europeus do G7 não conseguirão aprovar qualquer reforma tributária, a menos que obtenham a aprovação unânime no interior da União Europeia.

Segundo Nogueira Leite, para este novo patamar de 15% ser eficaz “tem de forçar zonas opacas (o Dubai é só um de muitos exemplos), chegar a acordo na UE e não permitir alçapões”. “Não vai ser fácil mas não é impossível”, comentou.

Depois, resta saber como reagirão as multinacionais que são as principais visadas por esta estratégia. O vice-presidente do Facebook com o pelouro dos assuntos globais, Nick Clegg, tomou uma posição diplomática. “O Facebook há muito que apela à reforma das regras globais de tributação e saudamos o importante progresso feito no G7. O acordo de hoje é um primeiro passo significativo no sentido da previsibilidade para os negócios e do fortalecimento da confiança pública no sistema global de tributação”, comentou.

Há ainda alguma incerteza sobre o leque de empresas que serão abrangidas por novas regras. Mas a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, já deu algumas luzes. Empresas como o Facebook e Amazon estarão no caminho. “Incluirá grandes empresas lucrativas e essas, creio, serão elegíveis em praticamente qualquer critério”.

O próximo passo deste acordo está agendado para julho, quando decorrerá uma reunião dos ministros das Finanças do G20. Se deste encontro sair um acordo que confirme a tributação mínima global de 15%, dificilmente outras economias de baixa carga fiscal sobre os rendimentos das empresas conseguirão travar a iniciativa.