Economia

Fundo de Resolução tem litígios de €331 milhões com Novo Banco. Se perder, mecanismo quase se esgota

O presidente do Fundo de Resolução, Luís Máximo dos Santos, disse esta terça-feira no parlamento que não fosse a oposição do Fundo, "o limite de 3,89 mil milhões de euros provavelmente seria atingido este ano". E que das "240 operações (vendas) submetidas pelo Novo Banco, apenas 35% foram aprovadas nos exatos termos propostos"

António Pedro Ferreira

O Fundo de Resolução tem litígios de 331 milhões de euros com o Novo Banco, e o mesmo quer dizer que, se este veículo perder esses diferendos no tribunal arbitral, quase se esgotará o valor máximo previsto no mecanismo de capital contingente.

Aliás, esse facto foi defendido pelo líder do Fundo de Resolução, Luís Máximo dos Santos, na audição na comissão de inquérito ao Novo Banco, esta terça-feira, 18 de maio: “não fora a intervenção do Fundo de Resolução e o limite de 3,89 mil milhões de euros provavelmente seria atingido este ano”.

O mecanismo de capital contingente é o sistema criado em 2017, aquando da venda à Lone Star, que expõe o Fundo de Resolução a uma possível injeção de 3,89 mil milhões de euros no Novo Banco, para cobrir perdas em ativos problemáticos. Até este ano, o banco liderado por António Ramalho solicitou 3 mil milhões e, em 2021, por conta das perdas do exercício anterior, pediu 598 milhões à luz deste mecanismo, mas com o Fundo a apontar que poderá apenas colocar 430 milhões, precisamente porque discorda de montantes (dez dias depois do prazo limite, o valor ainda não chegou ao banco, mas Máximo dos Santos prometeu para os próximos dias, após a análise que está a ser feita).

Destes 598 milhões, 166 milhões de euros dizem respeito aos custos com a venda da sucursal espanhola, que o veículo que funciona junto do Banco de Portugal discorda da imputação de encargos em 2020, já que a alienação - que só aconteceu em 2021 - nem era uma exigência da Comissão Europeia.

Este valor – que poderá ir para tribunal arbitral – junta-se a outros dois litígios, relativos à contabilidade e a aplicação da norma IFRS 9, que, se fosse como o Novo Banco pretendia, teria encargos adicionais para o Fundo de Resolução.

Ao todo, são 331 milhões de euros, apontou Máximo dos Santos aos deputados. O Fundo também travou que fosse ele a pagar pelos prémios de 4 milhões de euros à comissão executiva nos últimos dois anos, prémios que estão proibidos pela Comissão Europeia, mas que foram atribuídos, para poderem ser pagos a partir de 2022.

Havendo a injeção deste ano, e caso perca todos estes litígios, o mecanismo do Fundo – que poderia estender-se até 2026 – ficará perto do seu limite. A decisão do tribunal arbitral sobre o IFRS 9 só deverá chegar no final do ano, mais de um ano depois do prazo inicialmente avançado.

Antonio Pedro Ferreira

Operações negadas, mas não é importante

A afirmação sobre os litígios serviu para Máximo dos Santos defender que o Fundo não aceita tudo do banco liderado por António Ramalho: “Das 240 operações que lhe foram submetidas pelo Novo Banco para pronúncia, apenas 35% foram aprovadas nos exatos termos propostos. 85 operações foram aprovadas na condição de serem cumpridas determinadas exigências do Fundo, 38 foram aprovadas com recomendações e 28 não mereceram sequer autorização”.

Ainda assim, o também vice-governador do Banco de Portugal admite que ir contra tudo tem custos: “Face ao mecanismo temos o dever de nos pronunciar a operações que nos sejam sujeitas face aos ativos. Mas não é tão importante, do ponto de vista da gestão, como possa parecer. Por exemplo: se o Fundo disser ‘não autorizo porque me parece que o valor é muito baixo’, o que acontece é que o auditor vai analisar o valor desses ativos, e pode dizer que o valor de referência que tem é o melhor e vai mandar fazer imparidades. E ficamos no pior dos dois mundos: nem o ativo sai do balanço, e tem de se reforçar imparidades”.

Mecanismo evitou o pior

O mecanismo de capital contingente foi uma espécie de garantia negociada em 2017 para que a Lone Star não se responsabilizasse sobre todos os ativos tóxicos do Novo Banco. Máximo dos Santos defende que esse mecanismo implicou o pior, e que só funciona com duas alavancas (redução de preços dos ativos problemáticos e descida dos rácios abaixo do limite).

“O cenário base [do mecanismo] é de 3,89 mil milhões, o cenário adverso da Lone Star era de 3,7 mil milhões – o cenário da Comissão Europeia era mais negativo. O sentimento da Comissão era tão negativo que, a uma certa altura, ficámos preocupados com a desistência da Lone Star. Foi possível com este mecanismo evitar o pior”, defendeu, frisando que uma garantia sobre todos os ativos seria de 7 mil milhões de euros - “era mais do que o cenário adverso”.

Na sua intervenção, Máximo dos Santos quis deixar claro perante os deputados que a responsabilidade do que se passa em torno do Novo Banco tem uma causa: "os atos de diversos administradores do Banco Espírito Santo que materializaram graves violações de princípios elementares de gestão sã e prudente".

"A um jovem que hoje tenha 18 anos e que leia jornais ou veja televisão parecer-lhe-á, ouvindo alguns relatos e declarações, que os problemas do Novo Banco têm origem direta nele e são todos da sua responsabilidade ou, pior ainda, das autoridades públicas que têm a ingrata tarefa de conduzir a um final aceitável tão difícil missão", contestou o vice-governador.