Economia

Em ano de pandemia os portugueses deixaram de comprar roupa, mas investiram em aspiradores e auriculares

O saldo final do Barómetro de Vendas da APED revela uma quebra de 1,5% nas vendas em ano de pandemia. É uma percentagem que reflete todas as alterações do consumo em Portugal num ano “fortemente condicionado” pelas restrições impostas pela covid-19 e em que o vestuário mingou mais de 30%

Barcroft Media

Depois de um ano “fortemente condicionado” pela pandemia, no arranque de mais um exercício que "continua a ser dominado pela incerteza", a APED - Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição deixa pelo menos um sinal de otimismo para os 130 mil trabalhadores das 4.126 lojas do seu universo de associados: “Não temos perspetiva de perda líquida de emprego”, diz o diretor-geral da associação, Gonçalo Lobo Xavier, na apresentação do Barómetro de Vendas de 2020.

Feitas todas as contas, combinando dados da Nielsen, Kantar e GFK, a APED, que representa 168 lojistas do retalho especializado e alimentar conclui que o saldo final das vendas do sector é negativo em 1,5% face a 2019 (€22.653 milhões), mas esta percentagem reflete realidades diferentes vividas nas duas frentes comerciais: o retalho alimentar (€15.621 milhões) cresceu 8,1%, enquanto o retalho especializado (€7.032 milhões), “especialmente penalizado”, caiu 17,7%.

E no detalhe dos números apresentados esta terça-feira, há muito para descobrir ou confirmar sobre o que mudou na vida dos portugueses durante a pandemia. Desde logo, no segmento alimentar, os congelados pontuam como a categoria de produtos com maior crescimento (17,6%), mas a mercearia e os perecíveis também sobem 11,6% e 11,5%, respetivamente.

Mais: a quota de marca própria no alimentar subiu 1,4 pontos percentuais face a 2019, para os 35,1%. E nos canais de distribuição também houve algumas mudanças que podem indicar uma “viragem dos portugueses para as lojas de proximidade”: a fatia dos hipermercados engordou 0,2 pontos percentuais (23,6%), enquanto a dos supermercados emagreceu 1,4 pontos percentuais (57,7%), a da categoria “hard discounters” ganhou 0,6 pontos percentuais (11,2%) e a dos outros locais cresceu 0,5 pontos percentuais (7,5%).

Menos telemóveis e menos roupa

No campo do retalho especializado, “fustigado por medidas que tiveram um impacto tremendo na operação”, o segmento que mais cresceu foi o da informática (23,1%), puxado pela procura de portáteis (+31,3%) e tablets (+25,5%). Mas o segmento dos pequenos eletrodomésticos também refletiu o impacto da pandemia, uma vez que o consumo de aspiradores deu um salto de 29,4% e o de máquinas de bebidas (café) cresceu 23,9%.

Já a venda de telemóveis caíu 6,5%, acompanhada de uma descida de 16,6% nos livros, enquanto os auriculares dispararam 33,3%.

O vestuário protagonizou a maior quebra, com uma variação negativa de 32,5% no volume de vendas.

E o comércio eletrónico? “Ganhou novo impulso”, assumindo quotas de 3% no retalho alimentar (2,2% em 2019) e de 14,9% no especializado (8% em 2019).

Neste segmento em concreto, Gonçalo Lobo Xavier admitiu que “houve retalhistas com crescimentos de 50% a 60% no retalho alimentar” e “muitos hábitos de consumo vieram para ficar e têm-se estabilizado”. Recordou, ainda, que gigantes como a Amazon ou a Tesco viram as suas plataformas colapsar e tiveram de suspender algumas semanas o comércio eletrónico para investirem no reequilíbrio da capacidade de resposta”. Já os operadores em Portugal “mostraram ter as plataformas bem preparadas para o aumento da procura”, comentou. “Neste campo, o desafio no país foi adequar a resposta em termos de logística e de transportes”, sublinhou”.

De qualquer forma, o grosso das compras online em Portugal é feito em plataformas internacionais. Em 2019, esta quota era de 85%, sendo que para 2020 a APED ainda não tem dados.

45 aberturas, 36 encerramentos

Outro dado sobre o andamento do negócio, mas limitado aos associados da APED e às suas 4.126 lojas, mostra que houve 45 aberturas em 2020, contra as 64 inaugurações registadas um ano antes. E nestas aberturas 30 foram no sector alimentar e 15 no universo do retalho especializado.

Também houve 36 encerramentos (50 em 2019), 32 dos quais relativos ao sector alimentar, sendo as restantes quatro no retalho especializado. Mas o diretor-geral da APED fez questão de deixar claro que apesar das dificuldades sentidas no seu universo de associados, no saldo das lojas que fecharam “esteve essencialmente em causa reestruturação de negócios”.

E houve investimentos, desde logo na segurança das lojas e dos trabalhadores. “Foram milhares e milhares de lojas”, diz Gonçalo Lobo Xavier, indicando que este item representou crescimentos de 2% a 3% nos orçamentos para investimento dos retalhistas.