Economia

Bruxelas deve abandonar limite de 60% do PIB para a dívida pública, sugere órgão de fiscalização das contas europeias

A regra do limite de 60% para a dívida pública dos membros da União Europeia é “irrealista”, disse quarta-feira Niels Thygesen, o presidente do Conselho Orçamental Europeu, o organismo independente da Comissão Europeia que fiscaliza a aplicação do orçamento da União

Índice de igualdade de género na União Europeia marcada por algumas conquistas, mas também pela covid-19
YVES HERMAN/REUTERS

O organismo que fiscaliza as contas europeias recomendou esta quarta-feira a Bruxelas que abandone a regra de ouro da União Europeia que impõe um limite de 60% do Produto Interno Bruto (PIB) para a dívida publica dos estados membros.

“Não serve para nada ter um objetivo irrealista”, afirmou Niels Thygesen, o professor dinamarquês que preside ao Conselho Orçamental Europeu, a entidade independente de fiscalização da aplicação do orçamento da União Europeia, que funciona como organismo consultivo da Comissão Europeia.

Obrigar os governos da União a voltar a uma política de redução drástica da dívida pública, depois da pandemia, “exigiria demasiado”, acrescentou o académico.

O alerta de Thygesen é particularmente importante para os países com níveis de endividamento muito acima daquele limite, como é o caso de Portugal - que fechou 2019 com uma dívida em 117,7% do PIB, prevendo-se que dispare para 131,6% em 2020, um recorde histórico, descendo para 124,4% em 2021, ainda assim acima do nível de 2018.

O académico dinamarquês aconselha, por isso, que se fixem objetivos específicos para cada estado membro em função da situação concreta de cada economia. O Conselho está a preparar uma proposta nesse sentido para apresentar a Bruxelas em outubro no âmbito do seu relatório anual.

Medidas de austeridade matarão a retoma

Em virtude do disparo nas necessidades de financiamento para combater a pandemia e apoiar a recuperação, o endividamento público vai chegar a níveis recorde na União Europeia, e em particular na maioria das economias do euro. Segundo as previsões mais recentes da Comissão Europeia ainda serão 12 os estados membros com dívidas acima de 60% do PIB em 2021, nos quais sete registarão um endividamento acima de 100% do PIB. O grupo dos sete sobreendividados em 2021 será formado pela Grécia (182,6%), Itália (153,6%), Portugal (124,4%), Espanha (113,7%), França (111,8%), Bélgica (110%) e Chipre (105%).

Thygesen recomendou ainda prudência no regresso à regra do limite de 3% do PIB para o défice orçamental, depois dela ter sido suspensa em março face ao impacto recessivo da pandemia. Alertou que uma precipitação poderá levar a impor medidas de austeridade precisamente no meio da retoma económica, que ainda por cima se prevê ser lenta.

A Comissão deverá analisar no outono quando e como reintroduzir aquela regra de ouro de controlo orçamental. As previsões de Bruxelas apontam para 13 economias da União com défices acima de 3% em 2021. Portugal não se encontra nesse grupo, com a previsão de reduzir o défice de 6,5% em 2020 para 1,8%.

Recorde-se que a guinada para a austeridade em abril de 2010 recomendada pelo Ecofin (órgão dos ministros das Finanças da União Europeia) agravou a crise das dívidas soberanas nos periféricos do euro e abriu caminho à recaída em recessão da União em 2012 e da zona euro em 20212 e 2013.