Economia

Covid-19. Banca está preparada mas existem muitos fatores de risco e vulnerabilidades

Os bancos portugueses estão mais fortes para responder à atual crise, mas tudo dependerá da sua duração e da recuperação da economia. O risco de crédito e a elevada exposição a dívida publica são as maiores ameaças sobre a banca

Foto Inês Duque

O impacto da crise gerada pela pandemia de covid-19 sobre a banca terá de ser monitorizado e ajustado quer a nível nacional quer a nível europeu, alerta o Banco de Portugal no relatório de Estabilidade Financeira de junho.

Divulgado esta quarta-feira, o documento traça um cenário mais otimista sobre a situação dos bancos na atual crise face à anterior. Os bancos portugueses estão mais fortes para responder à atual crise, mas tudo dependerá da sua duração e da recuperação da economia, referindo que esta crise pandémica "constituirá um teste à resiliência do sector financeiro nacional e internacional".

Apesar de os riscos decorrentes desta crise terem tido uma resposta rápida por parte das autoridades nacionais e internacionais, é preciso estar atento às vulnerabilidades que advêm quer da evolução e controle sanitário, quer da recuperação económica. Ou seja, tudo é ainda incerto, mas os bancos são um dos sectores que serão afetados, nomeadamente pelo aumento do crédito malparado e da exposição a dívida pública.

O relatório sublinha que os bancos têm almofadas de capital para fazer face a esta crise e que as autoridades europeias também estão a atuar no sentido de aliviar exigências, nomeadamente o Banco Central Europeu (BCE).

O Banco de Portugal refere que "o impacto da pandemia tenderá a ser mitigado, pelo menos no curto prazo, por um conjunto de fatores" que estão a ser tomados como sejam a "partilha de custos da pandemia entre setores e entre países", a flexibilização na "aceitação de planos de conservação de capital das instituições menos significativas", assim como a manutenção da reserva contracíclica em 0% do montante das posições em risco, adiado por um ano, ou mais reservas que no atual contexto não fazem sentido, tendo em conta o facto de este "choque ser 'exógeno' ao setor financeiro" e não estar "diretamente relacionado com a acumulação prévia de desequilíbrios macroeconómicos e financeiros".

Mercados, dívida pública e malparado

Ainda assim, a pandemia, diz o relatório, acentuou um conjunto de riscos que podem ser amplificados por vulnerabilidades existentes.
A favor da banca em Portugal, o supervisor destaca o facto de o sector ter "promovido, nos últimos anos, um reforço dos rácios de capital e da posição de liquidez", o que foi um problema na última crise. Mas também alerta para o facto de muitos dos sectores afetados pela pandemia no curto e médio prazo poderem trazer problemas e dificuldades à banca.

O aumento do crédito malparado é um deles, apesar de ser ainda impossível fazer estimativas sobre a dimensão do agravamento no médio prazo. E não há ainda sinais do nível de crédito malparado gerado nestes meses, refere o supervisor da banca. Por isso, é preciso uma monitorização à vista das situações, uma continuada avaliação do risco e ajustamentos ao nível da regulação à medida da evolução da situação.

O supervisor alerta, ainda, para a desvalorização abrupta dos mercados e antecipa que os níveis de capitalização dos bancos podem descer no futuro, não só pela absorção de eventuais perdas, sobretudo aquelas que são relativas "a um aumento do incumprimento do crédito concedido ao setor privado não financeiro, num contexto já anteriormente caracterizado por baixos níveis de rendibilidade", lê-se no relatório.

Por outro lado, prossegue o Banco de Portugal, "poderá também refletir a potencial desvalorização das carteiras de dívida pública, em particular para os sectores bancários mais expostos a este ativo, tendo em consideração o aumento das necessidades de financiamento das administrações públicas, não obstante o efeito mitigador da política monetária do BCE". E faz questão de enunciar que, em linha com o contexto europeu, "o outlook dos principais bancos portugueses, já na sua maioria abaixo do nível de investimento, foram também revistos em baixa pelas agências de notação financeira. Neste âmbito, a Fitch reviu para negativo o BPI, o BST, BCP e CGD, a S&P colocou o BCP em neutro e o Haitong em negativo, e a DBRS fez o mesmo revendo para negativo o Novo Banco, a CGD e o BCP. A Fitch sinalizou, também, uma revisão negativa do rating para a Caixa Económica Montepio Geral (rating watch negativo).

Endividamento das famílias e empresas ainda é elevado

A par das vulnerabilidades apontadas para o sistema financeiro, apesar estar mais capaz de responder aos desafios da pandemia e não se debater com problemas de liquidez como aconteceu na última crise, o Banco de Portugal sublinha que os níveis de endividamento das empresas e famílias são ainda elevados.

A este respeito, o relatório de Estabilidade Financeira sublinha ser "crucial avaliar, neste processo, a viabilidade económica e financeira das empresas, bem como selecionar os instrumentos mais adequados para o seu financiamento", já que "o perfil da recuperação económica bem como o impacto global esperado da crise pandémica deverão ser tomados em conta no desenho de medidas de apoio às empresas, que poderão ter de ser focadas em capital e não apenas em dívida, aumentando desta forma, de forma sustentável, a sua capacidade de absorção de perdas".