Olga Martins, CEO da Lavradores de Feitoria
"Não sendo um bem de primeira necessidade, o vinho é um produto que naturalmente é penalizado em alturas de crise"
Quais são os principais desafios que tem enfrentado nesta fase?
Os desafios são muitos e em muitas frentes. Antes de tudo, a questão de saúde pública. Como reagir a uma pandemia, como manter alguma normalidade de funcionamento sem colocar em risco os nossos funcionários, parceiros de negócio e clientes. Depois, e é um grande desafio, a enorme incerteza face ao futuro. É muito difícil traçar um plano com tantas variáveis em aberto - quando os mercados abrem, que resposta irá haver por parte dos consumidores, a que velocidade a economia irá retomar…
... a indústria vinícola pode ficar permanentemente afetada?
Vai certamente sofrer muito. Não sendo um bem de primeira necessidade, o vinho é um produto que naturalmente é penalizado em alturas de crise. Depois temos a questão do turismo, que é fundamental para a venda directa, promoção e venda indirecta, e estava a ter uma performance notável. A enorme recessão neste sector vai afectar e muito a indústria. A quebra de vendas vai levar a um excedente de produção, o que provocará uma descida de preços. Em muitos casos para valores abaixo do preço de custo do produtor. Isto representa um enorme prejuízo para o produtor em si mas vai também afectar todo o sector. Nos mercados de exportação, por exemplo, o árduo trabalho no posicionamento dos nossos vinhos que tem vindo a ser desenvolvido por entidades e produtores poderá cair por terra. Os danos serão muitos e difíceis de avaliar.
O que está a fazer para lidar com a crise?
Nós tomámos uma decisão, que à pequena escala, acho muito importante. Não avançamos para lay-off, não atrasámos pagamentos a fornecedores nem abrandámos ou parámos um grande investimento que tínhamos a correr que é a construção da nossa nova adega. Com isto tentamos manter a pequena economia e evitar um efeito dominó, com uma retração enorme no consumo por diminuição dos rendimentos. Depois, em termos comerciais, apontámos baterias a mercados que estão a sofrer menos com a pandemia (ou que aplicaram menos restrições) e aos mercados que foram atacados inicialmente e por isso já ultrapassaram a pior fase e vêm a sua economia a recuperar. Também investimos mais no digital, quer no e-commerce quer em termos de comunicação. Na realidade já o estávamos a fazer, esta crise só veio acelerar o processo. Estamos também a implementar processos internos de forma a melhorar a nossa performance na produção, comunicação e relação com os clientes. O abrandamento do negócio permitiu-nos afectar mais tempo a estes programas que são sempre morosos e complicados de arrancar. No fim desta crise seremos certamente uma empresa mais eficiente e melhor.
João Portugal Ramos, fundador da João Portugal Ramos Vinhos
"É essencial haver uma retoma o mais rápido possível do sector da restauração"
Quais foram as medidas que tomou quando se apercebeu da gravidade da situação?
A nossa primeira preocupação foi assegurar o bem estar dos colaboradores e assegurar que todos estavam em condições de cumprir as medidas de isolamento social, mesmo mantendo a produção sempre a funcionar. Para esse efeito adotámos um funcionamento por turnos na produção e promovemos o teletrabalho para os restantes colaboradores. Produzimos ainda 15 mil litros de álcool-gel para apoiar entidades pública das regiões onde operamos (Estremoz, Douro e Lisboa). Em paralelo, acedemos às moratórias disponibilizadas pelo sistema financeira para garantir uma maior estabilidade financeira para atravessar este período de grande incerteza. Nesta fase estamos sobretudo focados em acompanhar os nossos clientes e parceiros, em Portugal e no exterior, de modo a retomarmos a atividade regular assim que a economia e a crise sanitária o permitirem.
Os apoios são suficientes?
Há uma forte redução da procura que tem originado maiores níveis de stocks dos produtores, o que causa preocupação sobretudo pelo aproximar da vindima, podendo impactar a estabilidade de preço. Nesse sentido parece-nos que os apoios já anunciados pelo Estado à 'stockagem' e à destilação para precaver este efeito (€10 milhões), são claramente insuficientes para o que está em causa.
Quais são as expectativas para as próximas semanas?
O principal desafio que temos enfrentado nesta fase é lidar com a forte desaceleração de vendas no mercado nacional. Estamos com as nossas marcas muito expostas ao mercado on-trade (Horeca) que parou desde o inicio de Março, com impacto imediato nas nossas vendas. Temos conseguido evitar lay-offs e outras medidas que afetem os nossos colaboradores, através de um maior foco na exportação e das boas relações que temos com o off-trade em Portugal. Para os próximos meses é essencial haver uma retoma o mais rápido possível do sector da restauração.