"Quando a procura global cai, uma procura interna forte" é fundamental, disse esta sexta-feira em Frankfurt Christine Lagarde, a nova presidente do Banco Central Europeu (BCE), na sua primeira intervenção pública.
Num discurso claramente político no Congresso Bancário Europeu, respondendo ao tema de "Novas Abordagens para a Europa", Lagarde frisou que é precisa "uma nova combinação" de políticas públicas na zona euro, onde as políticas governamentais têm de virar o foco para a dinamização da procura interna.
Nessa viragem, é preciso mais investimento por parte dos governos e um esforço global na União Europeia para dar mais "poder ao mercado interno", completando-o nas vertentes digital, de capitais e de serviços.
A mudança de foco para a procura interna na segunda maior economia do mundo é indispensável porque o motor global do comércio internacional está afetado. As suas altas taxas de crescimento "a que estávamos habituados não são mais uma certeza absoluta", frisou Lagarde.
Mais investimento e inovação
Ora, no campo da procura interna, a situação não é famosa: nos últimos dez anos, depois da recessão, ela "tem crescido dois pontos percentuais abaixo do ritmo da década anterior à crise".
O BCE tem desempenhado o seu papel e vai continuar com a política "acomodatícia" dos últimos anos, frisou Lagarde, ainda que vá proceder a "uma avaliação estratégica" (que os analistas avançam poder ser anunciada na próxima reunião em dezembro) e continue atento "aos efeitos colaterais" (negativos) da política expansionista que tem em curso.
O momento exige dos governos mais "investimento e inovação", disse a francesa. "Embora as necessidades de investimento sejam, obviamente, específicas a cada país, existe hoje um argumento transversal para o investimento num futuro comum que seja mais produtivo, mais digital e mais ecológico", referiu a presidente do BCE.
O panorama do investimento dos Estados é fraco. "O investimento público na área do euro permanece um pouco abaixo dos níveis anteriores à crise. A parte das despesas produtivas no total das despesas primárias - que além da infraestrutura inclui a Investigação e Desenvolvimento e a educação - também caiu em quase todas as economias da área do euro desde a crise", sublinhou Lagarde.
Ganhos com mais mercado interno
O esforço de investimento por parte dos governos - nomeadamente dos com margem orçamental, como a Alemanha e a Holanda, como ainda esta semana sublinhou o Relatório de Sustentabilidade Financeira do BCE - tem de ser complementado nomeadamente pela conclusão do mercado único digital (que pode trazer ganhos anuais de €170 mil milhões) e do mercado único de serviços (cujos benefícios podem ascender a €380 mil milhões), adiantou a francesa.
A conclusão da União Económica e Monetária é outro desafio urgente, disse Lagarde aos banqueiros europeus, sublinhando que é necessária uma abordagem baseada num "equilíbrio correto" entre o risco moral e a falta de uma proteção comum.
A presidente do BCE pisca o olho em duas direções.
Aos resistentes a mais união monetária e nomeadamente aos países em que a poupança tem sido afetada pela política monetária (as taxas negativas), Lagarde diz que há que lhes garantir "uma proteção suficiente" contra o excesso na partilha dos riscos no conjunto da zona euro que pode gerar risco moral (um abuso por parte de algumas economias mais endividadas e com tentação para défices orçamentais elevados). Algo que uma audiência alemã aplaude.
Mas, por outro lado, há que garantir uma proteção comum que evite uma poupança excessiva em algumas economias do euro com excedentes externos elevados (como a Alemanha e a Holanda, por exemplo), nociva ao crescimento do conjunto da zona euro.
Lagarde vai presidir a 12 de dezembro à primeira reunião de política monetária do seu mandato. A expetativa é elevada em relação à primeira conferência de imprensa que vai dar enquanto líder do BCE.