Economia

Nem Finibanco nem Berardo: Constâncio reitera que Banco de Portugal não poderia travar créditos concedidos

O Público conta que o crédito concedido pelo Finibanco à Domusvenda foi travado por instruções do Banco de Portugal, ainda liderado por Vítor Constâncio. O ex-governador diz que pediu hoje informação ao supervisor e defende que não houve nenhuma anulação do crédito por decisão sua

José Fernandes

Vítor Constâncio mantém tudo o que tem dito: não havia, em 2010, “suporte legal” para que o Banco de Portugal revertesse créditos concedidos pelas instituições financeiras. Por isso, recusa que tenha havido alguma decisão do supervisor para travar um crédito concedido pelo Finibanco à Domusvenda - e diz que o supervisor garante essa informação. Assim, rejeita qualquer leitura de que poderia reverter o crédito concedido pela Caixa Geral de Depósitos a José Berardo, em 2007, tema escrutinado na comissão de inquérito ao banco público.

O governador do Banco de Portugal entre 2000 e 2010 volta a ser assunto nos jornais esta sexta-feira, 12 de julho, por parte do Público. O jornal relata que, no último destes anos, quando Constâncio ainda estava no cargo, ordenou ao Finibanco (que foi depois comprado pelo Montepio) que desse uma atenção especial a uma operação específica.

Escreve o jornal que o Finibanco vendeu créditos de 146 milhões, que já estavam abatidos ao ativo (reconhecidos como perdidos na totalidade no seu balanço), à Domusvenda, empresa de gestão e recuperaão de crédito, por 17,7 milhões de euros. Para financiar a operação, o Finibanco concedeu 17,4 milhões de euros de financiamentos ao veículo criado pela Domusvenda para fazer a compra destes créditos. Quer isto dizer que, segundo o relato do Público, o banco financiou uma entidade para lhe fazer uma aquisição.

O Banco de Portugal, na altura encabeçado por Vítor Constâncio, acompanhou a operação e, segundo o Público, concluiu mesmo que não havia qualquer garantia nem análise de risco. Daí que tenha dado duas opções: ou havia uma provisão a 100% dos créditos concedidos ou revertia o negócio. Foi este último passo que aconteceu. O jornal cita documentação de inspeção do Banco de Portugal que indica que o negócio foi revertido por instruções do supervisor. O que é rebatido pelo presidente da Domusvenda, João Costa Reis, que defende que fê-lo por sua iniciativa própria.

Mas o próprio Público comenta que não há uma decisão efetiva do Banco de Portugal sobre o tema. Houve persuasão para que a reversão da transação ocorresse.

A defesa de Constâncio

Vítor Constâncio também assegura que não há nenhuma decisão. E di-lo com base em dados transmitidos pelo supervisor da banca, hoje em dia liderado por Carlos Costa. “Tendo pedido informação ao Banco de Portugal sobre a notícia em causa, posso afirmar que não existiu qualquer decisão do Banco de Portugal a anular uma operação do Finibanco”, indica o antigo governador em resposta ao Expresso.

Só que Constâncio reitera: “Uma decisão desse tipo não teria suporte legal. E isto não é uma mera opinião pessoal minha. Trata-se de matéria de lei e não de opinião e tem sido sempre a posição do Banco de Portugal sobre o assunto”, continua Vítor Constâncio.

“Em carta do passado dia 17 de Junho, e referindo-se a um processo de não oposição a uma participação qualificada, o Banco de Portugal escreveu o seguinte à comissão parlamentar de Inquérito: ‘Nestas condições, uma decisão de oposição do Banco de Portugal à aquisição de participação qualificada tomada com o propósito de impedir a execução da operação de financiamento subjacente colidiria necessariamente com o enquadramento jurídico vigente’”.

Ou seja, Vítor Constâncio mantém, mais uma vez, que nada podia fazer para impedir que José Berardo reforçasse, em 2007, a posição no Banco Comercial Português com base numa conta corrente de até 350 milhões de euros aberta um ano antes na Caixa Geral de Depósitos. Não podia ir além da lei, sublinha. E a lei, defende, não permitia. Algo defendido também pelo ex-primeiro-ministro, José Sócrates, que considera que, a acontecer, seria uma "prevaricação".

No Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), há atualmente espaço para medidas preventivas (artigo 118.º) e medidas corretivas (116.º-C e 141.º). Como escreveu o Expresso, o Banco de Portugal defende que é “raro” impedir operações decididas anteriormente (artigo 118.º), mas que emite “diversas determinações” relativamente a operações concedidas ( 116.º-C e 141.º). Estes dois últimos são artigos acrescentados entre 2012 e 2014 à atual legislação, sendo que o primeiro já existe desde 2002.

O assunto será escrutinado no relatório da comissão parlamentar de inquérito ao banco público, cujo relatório preliminar, da autoria do deputado centrista João Almeida, é divulgado na próxima segunda-feira, 15 de julho.