Economia

10 perguntas a que Carlos Costa terá de responder hoje no Parlamento

Depois da EY, auditora da Caixa Geral de Depósitos, a comissão de inquérito ao banco público ouvirá esta quarta-feira o governador do Banco de Portugal, que foi também seu administrador por dois anos. Os temas são muitos e vão desde o seu envolvimento em créditos problemáticos às suas condições para estar em funções

Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa
TIAGO PETINGA/LUSA

O Governador do Banco de Portugal vai estar esta tarde, a partir das 17 horas, no Parlamento para uma audição na Comissão de Inquérito sobre a Caixa Geral de Depósitos. Para se perceber o que está em causa, o Expresso elencou 10 perguntas a que Carlos Costa não deverá escapar.

1. Qual o seu envolvimento nas reuniões em que esteve presente e originaram a concessão de crédito que se revelaram ruinosas para a Caixa Geral de Depósitos?

Os deputados querem escrutinar todos os responsáveis. E, tendo na sua posse as atas e informação sigilosa, podem fazer o contraditório com o que já foi dito pelo Governador na primeira comissão parlamentar de inquérito. Nesta audição, terão certamente de ouvir o Governador dizer o que já revelou o Expresso na edição de 16 de Fevereiro, sobre o que consta da sua defesa, e o que afirmou em entrevista à SIC dia 19 de fevereiro. Ou seja, Carlos Costa tentou afastar as dúvidas sobre o seu envolvimento em créditos ruinosos. Esteve nas reuniões mas estas não originaram as operações que acabaram por ser aprovadas. E, naqueles em que esteve presente e foram aprovadas não houve qualquer perda, referindo-se a três financiamentos. Vale do Lobo, Berardo (Metalgfest) e Manuel Fino (Investifino). Vai ter de o explicar novamente e mais detalhadamente.

2. Presenciou interferências políticas enquanto esteve na Caixa Geral de Depósitos?

Esta questão remete para o eventual aproveitamento da Caixa por parte dos sucessivos governos liderados por José Sócrates e Pedro Passos Coelho, assim como aos de pouca dura liderados por Durão Barroso e Pedro Santana Lopes. A avaliação da existência de interferência política é um dos elementos que consta do objeto a que se propõe a comissão de inquérito.

3. Por que razão o Banco de Portugal, enquanto supervisor, não obrigou a Caixa a constituir imparidades face a estes créditos quando sabia que estavam em risco?

Uma questão que assume particular relevância para apurar as responsabilidades do supervisor no acompanhamento ao banco público. Mas também serve para o atual governador explicar se o Banco de Portugal pode evitar, enquanto supervisor, o que os acionistas e os auditores não têm conseguido fazer. Uma pergunta que será seguramente feita a Vítor Constâncio que será ouvido amanhã, quinta-feira.

4. Por que razão os 25 grandes créditos em incumprimento geraram perdas e imparidades desta dimensão? Num total de 2,96 mil milhões de euros de crédito concedido em 46 operações, 1,2 mil milhões foram dados como perdidos no final de 2015 como revelou a auditoria da EY. A Caixa andou a empurrar com a barriga?

A pergunta dá para todos os gostos e as responsabilidades podem chegar a vários candidatos na mira da comissão parlamentar de inquérito. A CGD teria de ter capital para as reconhecer e não teve porque o acionista não a capitalizou? O acompanhamento destes créditos não foi feito de forma eficiente?

5. Como foi feita a supervisão à Caixa e a outros bancos depois da troika (2011 a 2014) ? Tendo sido mais intrusiva porque razão não foram detetados problemas e, nessa altura, não se fez a auditoria que hoje foi feita?

Reporta-nos à forma o escrutínio à banca, no que toca ao supervisor e aos auditores externos e internos e como têm desempenhado o seu trabalho apesar de haver de há uns anos a esta parte regras e exigências mais estreitas e que, por norma, dão menos espaço para incumprimentos.

6. Que tipo de responsabilidades pode agora o Banco de Portugal assacar relativamente aos responsáveis que passaram pela Caixa?

Provavelmente muito poucas. Mas é fundamental que Carlos Costa explique o que está em causa e quais as consequênicas que poderão vir para os ex-gestores do banco público. A maioria dos ex-administradores estão fora do banco e nem sequer ocupam cargos na banca ou em entidades supervisionadas pelo Banco de Portugal. São sete, como já noticiado pelo Expresso, incluindo o ex-presidente António de Sousa. E mesmo que se apurem responsabilidades serão sempre de menor impacto até porque são tardias, face às irregularidades eventualmente cometidas. A CGD está a avaliar possíveis responsabilidades civis, sendo que no Ministério Público é uma investigação a práticas eventualmente criminais que está em curso.

7. Por que razão demorou Carlos Costa a pedir para se afastar de decisões do Banco de Portugal relativas à Caixa?

Parece não fazer sentido que, tendo a auditoria sido entregue ao Banco de Portugal em junho de 2018 e sabendo o conselho de administração do supervisor que Carlos Costa participou em reuniões do conselho alargado de crédito em operações que levaram ao financiamento de créditos que correram mal, só em novembro tenha pedido escusa e só em 2019 tenha feito saber que o tinha decidido. Tanto mais que a sua decisão teve quer ver com o afastamento de ex-administradores da Caixa que não passaram a avaliação de idoneidade.

8. O Banco de Portugal vai enviar toda a documentação solicitada?

É uma questão que se tem colocado em várias comissões parlamentares de inquérito. O Banco de Portugal não tem enviado toda a documentação pedida pelos deputados. Só que há agora uma lei de transparência que obriga a que as solicitações de inquéritos parlamentares sejam satisfeitas. A questão é pertinente também porque há um documento pedido que o supervisor se tem recusado a entregar: a auditoria que foi feita ao trabalho do Banco de Portugal na supervisão ao Banco Espírito Santo. Esse documento foi feito por uma equipa liderada por João Costa Pinto, ex-vice-governador, contou com o apoio da Boston Consulting Group, e é crítico da atuação de Carlos Costa e também de Vítor Constâncio. Também tem sido pedido na justiça, nomeadamente por Ricardo Salgado, na sua defesa às condenações do Banco de Portugal.

9. Como compara a CGD com os restantes bancos?
A auditoria da EY olhou para as decisões de gestão tomadas na CGD entre 2000 e 2015, mas não faz nenhuma comparação com os restantes bancos. Ou seja, não há uma análise comparativa que permita perceber se os incumprimentos que se registaram no banco público também se justificaram nas instituições privadas. É possivel o Banco de Portugal e o seu Governador acrescentar alguma informação a este respeito.

10. Considera que tem condições para continuar em funções?

É uma pergunta que já se consubstanciou num pedido de exoneração do Bloco de Esquerda, que foi rejeitado pelos restantes partidos. Contudo, todos eles lançaram críticas ao governador. E afirmaram que esperavam pela comissão de inquérito para tirar conclusões. A comissão de inquérito (a terceira que se debruça sobre a CGD, a segunda que olha para a gestao do banco) está aí.