Economia

Garantias como as de Berardo são um problema em Portugal, diz OCDE

É necessário agilizar o regime de insolvência no país, considera a OCDE, que o classifica como um dos mais rigorosos entre os países da organização. A concessão de garantias pessoais é um dos fatores que traz dificuldades

Um dia depois de o jornal Público ter escrito que não há vestígios do aval pessoal de 37,8 milhões de euros dado por Joe Berardo para garantir dívidas da sua Fundação junto da Caixa Geral de Depósitos, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) escreve um relatório sobre a economia portuguesa onde assume que estas garantias pessoais, ainda que muito comuns, são um problema no país.

As garantias pessoais são exigidas, muitas vezes, a empresários com pequenas empresas, para que respondam com o seu património em caso de dificuldades das respectivas empresas. “Em Portugal, tais garantias são prática comum: apesar de os requisitos de colaterais serem dos mais altos entre os países da OCDE, o colateral assume normalmente a forma de ativos da empresa ou de garantias pessoais dos donos dos negócios”, escreve a OCDE no seu relatório económico de 2019 relativo a Portugal.

“Tais exigências de colaterais ajudam os bancos a evitar os negócios mais arriscados, mas, uma vez as empresas entrem em dificuldade, os bancos podem sentir um impacto negativo, já que a tomada de posse daqueles colaterais não é, na prática, fácil”, continua o relatório.

Estas garantias pessoais dos empresários tornam os procedimentos de insolvência “muito complicados”. Podem estender-se por muito tempo, custam dinheiro e o valor das garantias pode cair de forma expressiva durante esse período. “O que se reflecte numa taxa de recuperação muito baixa: apenas 5%, em média”, diz a OCDE, citando dados do Ministério da Justiça.

A otimização do regime de insolvência é um dos caminhos para a redução dos créditos problemáticos na banca portuguesa, sublinha a organização comandada por Angel Gurría. É uma frase, citada no relatório da OCDE de Fevereiro de 2019, que o diz: “Um regime de insolvência eficiente, permitindo uma acelerada resolução do endividamento, melhora o funcionamento dos mercados de crédito”.

Daí que a organização sediada em Paris diga que a legislação relativa às insolvências deva ser menos restrita. Talvez haja, assim, o recurso a ela por mais pessoas. O regime de recuperação (Processo Especial de Revitalização) para as empresas foi um bom passo no país, mas as insolvências pessoais continuam a causar dores de cabeça, conclui a OCDE. O regime “é muito exigente”, classifica o relatório. É o terceiro mais restrito dos países da OCDE, segundo conclusões próprias.

Havendo esta dificuldade, demora-se mais a resolver um problema na banca. A existência de créditos problemáticos nos bancos portugueses continua a ser um problema, tendo o segundo maior rácio entre os países da OCDE.

O Público noticiou este domingo que Joe Berardo deu um aval pessoal (um dos tipos de garantias pessoais) relativamente a dívidas da sua Fundação, que contraiu junto da Caixa Geral de Depósitos quando quis ganhar peso accionista no BCP. Esta tornou-se, depois, uma das dívidas problemáticas do banco público, sendo que a auditoria da EY feita aos atos de gestão não encontrou vestígios do aval concedido pelo comendador. A dívida da Fundação Berardo ascendia a 267,6 milhões de euros no final de 2015, sendo que só 46% desse valor estava, em 2015, sob imparidade, quando desde 2008 havia dúvidas sobre a cobertura do empréstimo pelos seus colaterais.