A cerimónia de entrega do primeiro Prémio Confúcio da Paz foi marcada pela confusão.
A criação deste prémio surgiu há três semanas e a China deu hoje a conhecer o seu vencedor. Conhecido como a "resposta pacífica" ao Comité norueguês responsável pelo Nobel, o primeiro Confúcio da Paz foi entregue ao político e antigo vice-presidente de Taiwan, Lien Chan, conhecido pelo seu trabalho em melhorar as relações entre Taiwan e China.
A lista incluía outros candidatos como o já vencedor de um Nobel da Paz, Nelson Mandela, os americanos Jimmy Carter (também vencedor de um Nobel), Bill Gates e o Panchen Lama, o número dois na hierarquia budista, cuja 11ª reincarnação (a atual) é disputada entre a China e o Tibete.
Mas Lien Chan, o vencedor do prémio, não esteve presente na cerimónia. Quem recebeu a distinção foi uma pequena rapariga chinesa, conhecida apenas como o "anjo da paz", assim como os 100 mil yuans (cerca de 11 mil euros).
Cerimónia atribulada
Segundo o "The Guardian", a cerimónia foi feita de forma apressada e em forma de conferência de imprensa num hotel em Beijing. Ainda de acordo com o jornal inglês, quando a organização foi questionada sobre se chegaram a contactar o premiado, não obtiveram uma resposta direta.
"Ele não está cá por uma razão. Ele sabe que recebeu o prémio" contou o responsável do júri, Tan Changliu.
A Associated Press contactou o escritório do político de Taiwan, vencedor do Confúcio da Paz, que admitiu ter sabido que era o vencedor pela imprensa.
"A paz é um valor universal e ninguém irá dizer que não. Mas não recebemos nenhuma nota sobre este prémio Confúcio e não temos nenhuma informação" revelou Ding Yuanchao, do gabinete de Lien Chan.
Apoio internacional à posição chinesa
Amanhã realiza-se em Oslo a cerimónia que visa honrar o Prémio Nobel da Paz deste ano, Liu Xiaobo, um preso político chinês que atualmente cumpre o quarto de 11 anos de prisão por "incitar a subversão do poder estatal" e alertar para a necessidade de reformas políticas com vista a democratização do país.
A China, quando anunciados os nomeados para a distinção do prémio norueguês, iniciou uma campanha de pressão sobre o Comité Nobel que ainda não acabou, mesmo após a decisão do vencedor: o Governo chinês alertou vários países que se estes marcassem presença na cerimónia de amanhã (sexta-feira) as relações comerciais com a China podiam sair prejudicadas.
A lista de países que aceitaram o alerta chinês conta com Rússia, Sérvia, Venezuela, Irão, Cuba, Nepal e Arábia Saudita. De acordo com uma nota oficial do governo chinês, são "mais de 100 países e organizações mundiais que já expressaram o seu apoio à posição chinesa face ao vencedor do Prémio Nobel da Paz deste ano."
O facto da cerimónia do Prémio Confúcio da Paz decorrer na véspera da cerimónia Nobel, não pode ser apenas coincidência. Ou pode?
Zhao Zhenjiang, membro do júri do prémio Confúcio, conta que preparam a entrega deste prémio desde 1988, mas hoje foi a altura ideal pois "os EUA e a Coreia do Sul já realizaram exercícios militares a uma grande escala no Mar Amarelo (local onde recentemente a Coreia do Norte disparou sobre uma das ilhas da Coreia do Sul). Os seus porta aviões estão a caminho" disse o jurado que não quer ver uma guerra entre a China e os Estados Unidos.
A Associated Press destaca que os membros do júri são académicos pouco conhecidos, o valor monetário foi dado por alguém que escolheu ficar anónimo e apesar da organização dizer que esta tentativa de promover a paz foi trabalhada de perto com o ministério da Cultura da China, estes disseram mais tarde que o Governo nada tinha a ver com a cerimónia.
Primeira cerimónia mais antiga que Nobel de 109 anos
Outro dos destaques da estranha primeira cerimónia, foi o facto do júri destacar a longa história do prémio. Ainda mais antiga que do Nobel.
Tan Changliu, presidente do júri, destacou que "a China é um grande território e como sabemos há vários países pequenos no mundo ocidental. Por isso as raízes da paz na China são mais profundas que nesses países. Então o que está correto: que o Nobel da Paz tenha inspirado o Confucius da Paz, ou que o Confúcio da Paz tenha inspirado o Nobel da Paz?", deixou então a pergunta.
Não se sabe se o próprio Tan Changliu saberá a resposta, mas fica a informação de que o Nobel é atribuído em diversas categorias desde 1901.
China Confúcia
A escolha do nome de Confúcio para a entrega de um prémio da Paz promovido pela China é também merecedor de destaque.
Durante "O Grande Salto" e a revolução cultural que a China promoveu no século passado, a obra de Confúcio e o Confucionismo eram renegados e ao longo da história da República Popular da China as cerimónias religiosas que Confúcio defendia foram proibidas.
Como destaca o "The Guardian", esta cerimónia chinesa teve no entanto algo em comum com a cerimónia que atribuiu o Nobel da Paz a Liu Xiaobo: a ausência dos vencedores. Mas ao contrário de Lien Chan, Xiaobo não teve escolha na matéria.