ARQUIVO A festa de Darwin

Opinião: Porque há tantas espécies na Terra?

Hoje podemos revisitar Darwin e explicar os padrões e processos que estiveram na origem da enorme diversidade biológica da Terra.

Nuno Ferrand*

Há cerca de 150 anos, a publicação de "A Origem das Espécies", por Charles Darwin, revolucionou completamente a nossa forma de pensar e explicar a extraordinária diversidade biológica já então conhecida na Terra.

Depois de uma célebre viagem de cinco anos à volta do mundo no Beagle, e de um longo período de reflexão, Darwin elaborou uma complexa e detalhada argumentação que mostrou, inequivocamente, como todas as espécies são aparentadas umas com as outras e propôs um mecanismo explicativo para a sua evolução, que designou por selecção natural.

Nasceu assim a Teoria da Evolução e a ruptura com uma concepção do mundo essencialmente fixista, onde todas as espécies teriam resultado de um acto único de criação sobrenatural.

Quase um século e meio depois, é absolutamente notável como o pensamento de Darwin se mantém tão actual. Durante todo esse tempo, a Biologia cresceu como disciplina científica autónoma e tornou-se na mais dinâmica e vibrante actividade de investigação da actualidade.

Muitos acontecimentos decorreram nesse período: Mendel descobriu as bases da transmissão das características dos organismos e criou os fundamentos da Genética; Watson e Crick descreveram a estrutura da molécula de ADN e deram origem à era da Genética Molecular; e, nos últimos anos, grandes avanços tecnológicos permitiram a sequenciação completa de centenas de genomas, transportando-nos para a era da Genómica.

Hoje, podemos revisitar o longo argumento de Darwin sobre a evolução das espécies e, sobretudo, a extraordinária documentação que recolheu sobre a distribuição biogeográfica dos organismos para, através de instrumentação técnica e experimental de uma qualidade impensável ainda há poucos anos atrás, analisar e explicar detalhadamente os padrões e os processos que terão estado na origem da enorme diversidade biológica que caracteriza o nosso planeta.

O desenvolvimento e enorme diversificação da Biologia, a Genética Molecular e a Genómica, e ainda a revolução dos métodos de análise associada à crescente capacidade dos computadores, tornaram possível o estudo detalhado dos mecanismos de selecção natural e, mais concretamente, a compreensão aprofundada de como as espécies se adaptam de maneira tão notável a um meio ambiente em constante mudança.

Por outro lado, começamos também a compreender as bases moleculares da "especiação" e, por isso, os mecanismos que explicam a extraordinária e fascinante diversidade biológica que hoje conhecemos, desde as bactérias às aves, ou das orquídeas à nossa própria espécie. Começamos finalmente a compreender porque há tantas espécies na Terra.

Darwin gostaria de estar a par de todos estes avanços e, certamente, de os poder discutir connosco. Mas adoraria sobretudo saber que o seu pensamento continua a ser para nós todos, biólogos ou não, uma fonte permanente de inspiração.

*Professor e coordenador científico do CIBIO (Universidade do Porto)