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Caminho de Santiago Nascente: uma viagem única pela Beira Interior

Na região Centro, o Caminho Nascente de Santiago tem início em Vila Velha de Ródão. Estende-se por Castelo Branco, Castelo Novo, Fundão, Covilhã, Belmonte, Guarda, Celorico da Beira e tem, como última referência, o convento de São Francisco, em Trancoso. Verdadeiro convite à descoberta do Caminho Nascente, este itinerário jacobeu junta ao património histórico e religioso a força e a beleza da natureza

Castelo do rei Wamba em Vila Velha de Ródão
Pedro Cerqueira / Turismo Centro de Portugal

Hoje, os Caminhos de Santiago são muito mais do que um território de devoção. São caminhos de descoberta, de bem-estar e de procura de espiritualidade associados aos novos viajantes. São, de forma resumida, uma excelente oportunidade para conhecer as gentes, as tradições, a cultura, a paisagem e o património.

A Via Portugal Nascente ou Caminho Nascente recupera o Caminho de Santiago pelo Interior de Portugal entre Tavira e Trancoso. Daí continua para Compostela pelo Caminho de Torres e outros já existentes. Na região Centro, este itinerário jacobeu tem início em Vila Velha de Ródão e termina em Trancoso, convidando a uma viagem única pela beleza e mistérios da Beira Interior. Cruzam-se áreas urbanas como Castelo Branco, Fundão e Guarda, mas é a natureza que mais impressiona o viajante, com destaque para as serras da Gardunha e da Estrela.

Caminho Nascente de Santiago
Pedro Cerqueira / Turismo Centro de Portugal

Contemplação junto ao Tejo

o Caminho Nascente, com partida em Tavira, atravessa o Alentejo, antes de entrar na região Centro. Atravessar a ponte metálica, construída sobre o rio Tejo em 1884, para chegar a Vila Velha de Ródão, no distrito de Castelo Branco, é um ritual de contemplação, que tem ainda maior impacto nas Portas de Ródão. Sobranceiro a este santuário para grifos e mais de 100 espécies de aves está o castelo de Ródão, com a torre atalaia erguida nos séculos XII e XIII. Crê-se, porém, que este edifício de caráter militar existisse desde a ocupação dos visigodos, daí chamar-se castelo do rei Wamba. No cais de Ródão merece visita a Estação Arqueológica da Foz do Enxarrique, uma montra a céu aberto de vestígios atribuídos ao Paleolítico Médio. Na passagem por Amarelos pode conhecer e usufruir do forno comunitário de pão e da bolaria local.

Segue-se para Castelo Branco, outrora protegida por um castelo e uma muralha, fundados em meados do século XIII. Sugere-se uma visita à Catedral de Castelo Branco, datada do século XIII. No Museu de Arte Sacra de Castelo Branco (tel. 272348420), instalado na igreja do convento da Graça, do século XVI, é possível observar a escultura quinhentista do apóstolo de Jesus Cristo, São Tiago Maior. Para conhecer as tradições locais entra-se no Centro de Interpretação do Bordado (tel. 272323402), instalado na antiga Casa da Vila e dedicado ao saber fazer relacionado com a técnica utilizada pelas bordadeiras albicastrenses. No frondoso jardim do Paço Episcopal retemperam-se forças e contemplam-se as magníficas estátuas e os repousantes jogos de água.

Castelo Novo
Pedro Cerqueira / Turismo Centro de Portugal

Aos pés da Gardunha

A sinalética do Caminho Nascente indica a rota pelo vale do Romeiro e pela ponte setecentista de Santiago, sobre o rio Ocreza, em Cafede, aldeia onde se localiza uma capela erguida em honra do santo. Além da planície marcada por carvalhos e sobreiros em redor da barragem de Santa Águeda ou da Marateca, aos pés da serra da Gardunha, surge no caminho Soalheira, aldeia de rebanhos e de produção de queijo, já no concelho do Fundão. A subida à montanha é compensada pela panorâmica sobre a Cova da Beira, região famosa pelas cerejas com denominação Indicação Geográfica Protegida. Até ao cimo da Gardunha ainda faltam cerca de 5 km.

Já em Castelo Novo, uma das 12 Aldeias Históricas de Portugal, erigida em anfiteatro, destaca-se a praia fluvial. O castelo guarda séculos de história, segredos, lendas e a herança templária defendida a partir das muralhas. A rota segue até Alpedrinha que, situada na encosta sul da serra da Gardunha e conhecida pela preservação da tradição da transumância, integra a rede de Aldeias de Montanha. Nesta “Sintra das Beiras”, designação dada pela marquesa de Alorna, situa-se o palácio do Picadeiro (tel. 275561121), solar barroco do século XVIII. Hoje, é um espaço museológico de grande relevância histórica e cultura que merece a visita. Antes ou depois, observa-se o pelourinho e a Fonte do Leão. O caminho romano leva o peregrino até Alcongosta, a capital da cereja. Este percurso obriga a fazer uma descida, que justifica redobrada atenção e cuidado.

Centum Cellas, em Belmonte
Turismo Centro de Portugal

Caminhos da Fé em Belmonte

No Fundão, conheça a capela do Espírito Santo, edifício erigido no século XVI junto à capela do Calvário. Saiba mais sobre a aguardente local e o chá preto feitos a partir de cereja do Fundão, bem como os “Biscoitos de azeite” e os “Borrachões”. Observe a instalação de Bordalo II localizada junto à estação ferroviária, já depois de deixar o Fundão, a caminho de Valverde. O itinerário prossegue até chegar à ponte de Pêro Viseu para depois descer em direção a Ferro, no concelho da Covilhã, uma aldeia de ruas estreitas, casas em pedra e pomares de cerejeiras, onde se encontra a capela do Espírito Santo. Antes de se chegar a Belmonte, uma paragem em Caria. A aldeia é profícua em casas senhoriais, como a Casa da Torre (Tel. 275088698), edificada no século XVI, para acolher os bispos da Guarda. A malha urbana é marcada por igrejas, capelas e edifícios com história. O caminho continua até Belmonte, onde se destaca o castelo medieval. Nesta Aldeia Histórica de Portugal é obrigatória a visita à igreja de Santiago, monumento de culto religioso marcante para os peregrinos, datado do século XIII, e ao Centro Interpretativo dos Caminhos da Fé. O passado e influência judaicos estão bem patentes na sinagoga de Belmonte. A viagem ao passado complementa-se com o Museu dos Descobrimentos (Tel. 275088698), situado a dois passos da estátua erguida em honra a Pedro Alvares Cabral, filho desta terra e figura central da descoberta do Brasil. No Posto de Turismo pode agendar passeios guiados. Refresque-se com a cerveja artesanal Cabralina e prove as bolachas de cerveja e os biscoitos de azeite na mercearia Cabralina. A poucos minutos, na freguesia de Colmeal da Torre, encontra-se o Centum Cellas, um local enigmático, associado à era romana, que consiste numa estrutura edificada merecedora de contemplação, sobretudo ao pôr do sol.

Sé da Guarda
Pedro Cerqueira / Turismo Centro de Portugal

Mantas de papa

Já no extremo do concelho da Guarda, Valhelhas encanta com a praia fluvial banhada pelas águas do rio Zêzere. A rota atravessa a ponte Filipina e a barragem do Caldeirão, para chegar à igreja matriz, conhecida por igreja de Nossa Senhora da Assunção, na aldeia de Gonçalo, e depois à capela de Santa Cruz, em aldeia do Bispo. Em Maçainhas de Baixo aproveite para conhecer a produção de campainhas de bronze e de mantas de papa, que dão fama à freguesia. A entrada na Guarda, a cidade mais alta de Portugal (a 1056 metros de altitude), no planalto beirão, é feita pela Porta dos Ferreiros, construída no século XIII, a mando de D. Dinis. Merecem visita a torre de menagem do castelo e a vasta coleção artística do Museu da Guarda (tel. 271213460), onde também está instalada a Oficina do Peregrino, local indicado para carimbar a credencial de peregrino. Na cidade destacam-se ainda a Sé da Guarda, fundada em finais do século XIV e um importante espaço de culto religioso na Beira Interior, e os interiores da igreja de São Vicente, obra do século XVIII. Este roteiro urbano integra ainda o Pelourinho e a Porta d’El Rei, que remontam ao reinado de D. Dinis.

Rua da Alegria, em Trancoso
Paulo Chaves / Aldeias Históricas de Portugal

Sardinhas de Trancoso

De regresso ao Caminho Nascente, o rio Mondego ganha destaque na paisagem que se avista na descida de Ramalhosa. Com passagem na agradável praia fluvial de Aldeia Viçosa, o próximo destino é Celorico da Beira, localizada nos contrafortes da serra da Estrela. O castelo, que conserva os estilos românico e gótico, a igreja de Santa Maria, a matriz religiosa da vila, convidam a uma paragem, bem como o sítio arqueológico de São Gens, onde se encontra uma necrópole do tempo dos Visigodos. Aproveite para visitar o Solar do Queijo Serra da Estrela, instalado num edifício do século XVIII, situado no centro histórico de Celorico da Beira. Mais à frente, está o pelourinho de Forno Telheiro. Depois da ponte da Lavandeira, sobre o rio Mondego, que fazia parte da do trajeto de uma via romana que conduzia até Mérida, na vizinha Espanha, o itinerário indica Trancoso. Nesta Aldeia Histórica de Portugal destaca-se o convento de São Francisco ou convento dos Frades, datado do século XVI e que, em 2009, foi convertida, para receber o atual Teatro Municipal. Os visitantes devem provar as sardinhas de Trancoso, um doce tradicional, que é recompensa na reta final do Caminho Nascente de Santigo no Centro de Portugal, com entrada triunfal através das Portas d’El Rei, nas muralhas da cidade.

Texto adaptado do Guia Caminhos de Santiago - Centro de Portugal oferecido pelo Expresso a 29 de setembro de 2023

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