&conomia à 5ª

Vamos falar sobre fintech

Em dias de Web Summit vamos então falar de “inovação”, “disrupção”, “unicórnios”, e outra tecno-bicharada. O modelo de negócio da Davos dos Empreendedores (?!) parece ser este: conseguir subsídios públicos, conseguir patrocínios, cobrar altos bilhetes aos interessados e mobilizar trabalho não-pago a jovens universitários voluntários entusiasmados e agradecidos pelo acesso (sim, quando por esta altura os meus alunos começam a faltar às aulas e a dar sinais que estão a estudar menos já sei do que é). Ignoro se a Summit realmente aporta valor, mas pelo menos é pelo menos um “sumício” de valores … suponho que isso seja já meio caminho andado, não sei.

A economia virtual dos intangíveis precisa disto: pontos focais tangíveis, interacção real e animação a três-dimensões. Precisa de pão e circo. E o circo dá pão a muita gente (e desilusões a ainda mais gente).

Mas não falemos exactamente disso, pois hoje é o último dia e a tenda da Web Summit será desmantelada. Falemos de outro jargão, … um jargão de que a Comissão Europeia também gosta muito: a “quarta revolução industrial” ou “indústria 4.0”. Isto já não é a “nova economia” (isso era em volta do ano 2000), isto é a “nova nova economia”!

Mas neste tema “4-ponto-não-sei-quantos” falemos de um tópico em particular (os serviços), dentro dele abordemos um nicho específico (a finança), e foquemos depois num especto em especial (a regulação).

Desconheço se quadros do Banco de Portugal andaram pela tal Davos dos hipsters mas isto pelo menos é novo: em cerca de 15 dias o BdP pronunciou-se 5 vezes sobre o fenómeno da Fintech (três comunicações sénior na conferência da ASAFAC, uma entrevista de um administrador e uma apresentação pelo próprio governador no Museu do Dinheiro).

Isto só acontece após o Banco Central Europeu ter publicado linhas de guia sobre a apreciação a fazer quanto ao estabelecimento de novos operadores financeiros digitais (ver aqui). Este desdobramento da economia já estava no radar de várias organizações internacionais, tendo vindo a ser a ser estudado pela OCDE desde há bastante tempo (para uma actualização ver aqui). Atenção que autoridades monetárias mais a) viradas para compreender a natureza dinâmica da finança e b) com menos pudor em terem intervenções assertivas já há mais tempo que estão a preparar o terreno e a formatar caminhos (veja-se aqui a iniciativa do Banco de Inglaterra de meados de 2016).

Neste, como noutros casos, seria desejável mais capacidades antecipatórias por parte da entidade mandatada para a monitorização atenta dos fenómenos do sector que é suposto regular e supervisionar. Mas não será por acaso: essa atitude prospectiva implica a abertura perante teorias económicas fora do mainstream que até agora parecem não “incomodar” o consenso da Almirante Reis, tais como a escola evolucionista e a economia comportamentalista. Não é que seja bom exemplo, mas até Alan Greenspan não estava tão agarrado à noções de equilíbrio (já falava de “destruição criativa”) ou de racionalidade (já falava de psicologia) como se pode constatar por esta posição de 1998.

Para quem está de fora a observar o trânsito da Almirante Reis a visão ainda não é totalmente clara. A posição do BdP parece evoluir de encarar a Fintech como “A comercialização de produtos e serviços bancários através de canais digitais” (ou seja, apenas a modernização dos processos e do marketing dos incumbentes: algo que tem mais de 25 anos) para considerar que há novos actores que podem ser “concorrentes dos prestadores tradicionais” (os mesmos produtos, mas de base digital, supomos) mas também “instituições complementares ou parceiras” (numa lógica de simbiose, supomos).

Contudo, com a transformação dos modelos de negócio (tipo: peer-to-peer lending), novos processos (tipo: blockchain) e a emergência de produtos novos (tipo: bitcoin) não nos deixam descansados quanto à doutrina de base que está a ser adoptada: “level playing field” (na expressãoo BCE, ou neutralidade da regulação na tradução do BdP). Algo aqui parece ser insuficiente. Para quando uma Regulação 4.0?