… e, apesar de tudo, ela move-se.
Lisboa abriga um cacho de reguladores diferenciados (isto é, muitas vezes na mesma área genérica mas com especificidades e especializações) e variados (ou seja, cobrindo áreas diversas e não necessariamente contíguas). Para falar usando linguagem da moda, isso é um “cluster”. Em linguagem que se perceba: é um emaranhado.
Aí está: uma iniciativa de restruturação dos papéis e interligações da supervisão institucional desse vasto e transversal sector que é o financeiro (banca, capitais, seguros). O Governou impeliu um grupo de trabalho para processar os factos recentes da crise em Portugal na sua intersecção com o fenómeno regulador.
Comentário: certamente que se tem de começar por algum lado. Sendo assim, há prioridades. A actividade económica subjacente às mais perdas mais catastróficas da sociedade portuguesa desde a fundação do país tinha de ser o ponto de partida.
O que temos em Portugal, assim como nos outros países ocidentais onde a prática reguladora se autonomizou e cresceu, é já um verdadeiro sistema nacional de regulação. Isto é, um conjunto de actores e interacções que se orientam para funções mas de onde também emergem disfunções.
Implicação: o facto de não serem feitas menções ao resto do sistema regulador português é preocupante. Reformas num dos cantos do sistema criam referências, exemplos, externalidades para outros pontos do sistema … retroacções essas que deveriam ser levadas em linha de conta.
Note-se que o sector financeiro já se tem a si mesmo suficientemente em excepcional conta, com os supervisorers a ter por exemplo remunerações e regalias sem paralelo em outros sectores. E esta excepcionalidade tem sido um fonte de problemas (um deles sendo o bem diagnosticado síndrome da arrogância organizacional em que um regulador se crê ter o rei na barriga, e daí um dominó de quebras da cooperação inter-reguladores).
Corolário: a reforma da regulação em Portugal carece de uma visão integrada que passará por consolidações de instituições (afinal quem sabe quantos reguladores há em Portugal) e por uma maior harmonização dos procedimentos operacionais (de que condições dispõem os funcionários, que responsabilizações e retribuições têm), num quadro de reforçada transparência e sentido estratégico.
No caso em questão existem já alguns pontos que parecem, em princípio, interessantes como sejam a redefinição do perímetro de atribuições (extrair ao Banco de Portugal uma área em que este não demonstrou capacidade de servir o interesse público, a supervisão comportamental) e a promoção de equilíbrio no ecossistema regulador (por via da absorção de tarefas por parte de outras entidades). Porém, outros aspectos são problemáticos.
Dúvidas: avalie-se se a CMVM é mesmo a mais indicada instituição para isso e se, em caso positivo, não deveria ela própria ser reformatada à luz de um outra filosofia de base (o nome da CMVM deveria mudar em consequência assim como o seu guião). Importa também saber para onde irão os funcionários do BdP e como ficará a cultura organizacional de um regulador que os absorva. É importante saber-se já com clareza onde fica a missão de resolução bancária de última instância (num novo Conselho de Supervisão e Estabilidade Financeira), mas qualquer turbulência constitucional deveria ser evitada (isto é, seria desejável contornar a ideia já lançada de papel directo do Presidente da República que imponha uma revisão constitucional).
Eis, portanto, qualquer coisa. Talvez um início de uma busca de soluções que também aqui mostre que em Portugal se podem encontrar soluções de algum modo eficazes e influentes internacionalmente.