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“A ideia de que não se pode pintar porque o mundo é ‘feito de guerra e crueldade’ é a desculpa mais lamechas que já ouvi para não trabalhar”

“Um professor ou um taxista não vai trabalhar só quando lhe apetece. Um artista convicto não se pode dar ao luxo da inspiração. As musas são para os falhados”, defende Nick Cave em resposta a fãs no site “Red Hand Files”

Getty Images

Nick Cave deixou conselhos a todos os artistas que se sentem “desinspirados” pelo estado do mundo. Através do website “Red Hand Files”, o músico respondeu a dois fãs, Tam e Dan, que afirmaram ter perdido a sua “motivação para criar” e a sua “musa”.

Para Cave, o trabalho de um criativo “não é tão excecional assim que necessite de inspiração ou de uma musa”. “Somos artistas, trabalhamos ao serviço dos outros. Não é algo que façamos apenas quando nos sentimos motivados. Criamos porque é da nossa responsabilidade fazê-lo. Desse modo, o nosso trabalho não é diferente do da maioria das pessoas”.

“Um adulto comum, um médico, um operário, um professor, um taxista não vai trabalhar só quando lhe apetece. Estamos ligados ao nosso trabalho, como toda a gente, porque o espaço que ocupamos depende da nossa participação e quebra se não o fizermos”, continuou. “Um artista convicto não se pode dar ao luxo da inspiração. As musas são para os falhados”.

“A ideia de que não se pode pintar porque o mundo é ‘feito de guerra e crueldade’ é a desculpa mais pateta e lamechas que já ouvi para não trabalhar. Quando o mundo nos ataca com todas as suas feridas, fechamos os olhos e encolhemos-nos, ou sentamos-nos e erguemos os braços em desespero, ou corremos e fugimos, ou vamos de encontro a ele, como quando o fazemos com uma criança ferida, de braços abertos?”.

“Se somos artistas”, rematou, “temos de evitar as desculpas e fazer o nosso trabalho. O mundo está doente e pode ser cruel, mas seria ainda mais sem pintores e realizadores e compositores, sem os que criam beleza, a navegar pelo sangue e pela lama das coisas, ao mesmo tempo que procuram trazer o céu à terra. Não é altura de ficar quieto a lamentar a condição do mundo, é altura de trabalhar".