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Blitz

Kevin Morby fez um disco que é um grito de amor pela vida

“This Is a Photograph” convoca os fantasmas do músico e da cidade de Memphis (Jeff Buckley e Elvis Presley morreram ali) para, entre a soul, a country e o gospel, desenhar uma das mais belas viagens do ano

Kevin Morby

Lia Pereira

Desde adolescente que Kevin Morby, cantor-compositor nascido no Texas e criado no Kansas, sofre de ansiedade. “Podia estar sentado no sofá e tinha ataques de ansiedade. Conseguia perceber que ia tê-los, mas não conseguia evitá-los”, recorda o pai do norte-americano ao “New York Times”.

Depois de várias tentativas médicas para debelar o problema, o estado mental do jovem aspirante a músico melhorou quando os pais o deixaram apanhar um comboio para o centro do mundo que lhe interessava conhecer, Nova Iorque, onde integrou várias bandas antes de encetar, há quase 10 anos, uma bem-sucedida carreira a solo. A ansiedade — e os pensamentos recorrentes sobre a morte — são, porém, um amigo de longa data que nunca deixou de assombrar, de forma mais ou menos benigna, a sua obra. E a ameaça da velha ceifeira fez-se sentir, uma vez mais, em janeiro de 2020. A poucos meses da pandemia, o homem de “Harlem River” viu o pai desmaiar à mesa, durante um jantar de família. Jim Morby, cujo emprego obrigou a família a percorrer o país, enganara-se a tomar a medicação e acabou por ser levado para o hospital; pode ter sido só um susto, mas o episódio deixou Kevin Morphy a pensar na efemeridade da vida. Ao voltar para casa, encontrou uma caixa com fotografias antigas, e uma delas, na qual o Morby-pai tinha a idade do Morby-filho naquele momento, inspirou ‘This Is a Photograph’, espantosa canção que dá, também, título ao álbum. Cavalgada de ritmo contagiante e passada estilosa, típica de quem cresceu a amar Lou Reed, é o ponto alto de um disco que, não obstante a negra inspiração, ou graças a ela, é um grito de amor pela vida. Nascido após uma estada em Memphis, no Tennessee, “This Is a Photograph”, o álbum, convoca os fantasmas do músico e da cidade (Jeff Buckley e Elvis Presley morreram ali) para, entre a soul, a country e o gospel, desenhar uma das mais belas viagens do ano, com paragens panorâmicas em ‘Bittersweet, TN’ ou ‘Disappearing’. / Lia Pereira